MOBFOG – Mostra Brasileira de Foguetes – Você Não Vai Acreditar no Desempenho desses Pequenos Foguetes

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Garrafas PET, água, ar comprimido e paixão pelo espaço! São esses os ingredientes para construção e lançamento dos foguetes do nível 3 da MOBFOG – A Mostra Brasileira de Foguetes, uma competição estudantil irmã da célebre OBA – Olimpíada Brasileira de Astronomia.

Estudantes do 6° ao 9° ano do ensino fundamental de escolas públicas e privadas de todo o Brasil participam do nível 3 da MOBFOG, competem pelas medalhas que premiam os foguetes com maior alcance. Mas muito mais valiosos que a premiação são o espírito de colaboração e a oportunidade prática de aprendizado de conceitos de física, matemática e tecnologia aeroespacial proporcionados pela empolgante atividade.

Foguete nível 3 da MOBFOG 2023 de alunas do clube Meninas na Ciência, montado na plataforma de lançamento no campo do INPE em São José dos Campos para uma bateria de ensaios de avaliação. Após a análise dos voos, modificações foram realizadas para otimizar o desempenho dos foguetes!

Em São José dos Campos (SP) , um polo de pesquisa e desenvolvimento na área aeroespacial, os professores e estudantes de escolas públicas municipais ganharam o reforço de pesquisadores e técnicos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE/DCTA) no planejamento e análise do voo dos foguetes.

Para visualizar a dinâmica de voo dos velozes foguetes, o Laboratório de Registro de Imagens do IAE registrou os lançamentos em vídeo de alta velocidade, a 1000 quadros por segundo, permitindo analisar em detalhes a fase inicial do voo e identificar falhas de construção que prejudicam o desempenho dos foguetes.

E o que podemos aprender com os foguetes da MOBFOG?

Captura de tela do software Tracker com o lançamento de um foguete nível 3 da MOBFOG. Os gráficos à direita são do deslocamento e da velocidade do foguete em função do tempo. [créditos LRIM/IAE]

Analisando os vídeos com o software de rastreio TRACKER (um programa aberto e gratuito!), podemos acompanhar o deslocamento do foguete quadro a quadro. Plotando em um gráfico o deslocamento em função do tempo temos uma representação visual de cada fase do voo, identificando a evolução da velocidade do foguete. O Tracker está disponível para download para os os sistemas operacionais Linux, Mac OS X e Windows ou pode ser executado online em sua versão em JavaScript.

Assim que o foguete é liberado e inicia seu movimento, vemos um aumento constante da velocidade. Em seguida, o foguete deixa a base e a velocidade passa a variar com uma taxa mais elevada, mas aproximadamente constante, até que toda a água em seu interior é liberada. A partir daí o foguete segue uma trajetória balística, sujeita apenas a ação da gravidade e da resistência do ar.

A geometria do foguete tem um papel importante em seu desempenho. A posição e o formato das empenas e a posição do centro de gravidade podem torná-lo mais ou menos instável e interferir no alcance máximo. A contribuição desses fatores fica evidente na análise de vídeo.

Mas a maior surpresa pode vir dos valores de velocidade máxima e aceleração que os pequenos foguetes de garrafas PET podem atingir. Acelerações de 100g e velocidades acima de 60m/s foram registradas! Isso reforça a necessidade da estrita observação das normas de segurança: uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), sinalização e isolamento da área de lançamento!

E se tudo for feito com segurança, os lançamentos são um excelente recurso prático para o aprendizado de conceitos físicos como velocidade, aceleração, empuxo, pressão, momento e para a interpretação de gráficos.

O que um All Star velho e Apollo 17 possuem em comum?

Julia Brazolim: Um tempo atrás um anúncio abalou uma esfera da internet pois uma marca super famosa lançou um tênis similar ao clássico All Star, mas um pouco mais… destruído e por um preço inaudível. As pessoas ficaram indignadas. Mas entrando ou não no âmago da arte desconstruída na moda, esses dias eu tive uma ideia que me custou apenas R$38. Vou dar um breve contexto.

Eu sempre gostei de comprar All Star, substituindo os pares ao longo dos anos. E certo dia, eu estava olhando pra um dos meus pares mais antigos e encontrei rasgos atrás. Como minha vontade em customizar coisas é muito alta, na hora tive a ideia de passar a fita Silver.

Julia usando o All Star após o uso da fita no tênis

Brevíssima história da Fita Silver

A Silver Tape ou a famosa fita prateada usada tão comumente em filmes de ação, seja pra prender alguém como refém ou pra prender dinamites, foi criada pela operária norte-americana Vesta Stoudt no início dos anos 40 durante a Segunda Guerra Mundial. Ela enfrentou um problemão durante o processo de embalagem das munições de armas para enviar pros soldados, já que não era prático abrir no meio da guerra e dificultava o carregamento no meio da batalha. Então, ela decidiu criar uma solução. Vesta enviou a ideia e o requerimento da produção da fita em uma carta pro então Presidente Franklin D. Roosevelt, que achou incrível e pediu pro Conselho de Produção de Guerra começar a produzir. Depois ela até ganhou um prêmio pela invenção e teve sua patente.

Foto de Vesta Stoudt. Créditos: The Chicago Sunday Tribune (24/10/1943) e Kilmerhouse

E não parou por aí. Exatamente por ser super eficiente já que a fita consegue colar em superfícies ásperas, lisas e irregulares, é feita com um tecido e também super prática pra rasgar até com a mão (ou uso dos dentes), Silver Tape passou a ser usada pela sociedade pra tampar buracos, dutos de aquecimento e tudo o que precisasse. Inclusive, numa missão espacial.

Uma fita. Uma missão. Apollo 17!

Wandeclayt: Um dos itens mais versáteis e úteis entre os aparatos levados a bordo das missões espaciais opera verdadeiros milagres em pequenos (ou não tão pequenos) reparos também aqui na Terra.

E afirmamos com tranquilidade que esse é o item mais poderoso no universo das gambiarras dos reparos emergenciais, capaz de sanar vazamentos, reparar estruturas, compor adaptações ou simplesmente remendar aquele confortável tênis velho ou aquele paralamas danificado do seu jipe lunar!

A multi talentosa fita prateada carrega em seu currículo, além do tênis All Star da Julia, a façanha de ter participado de uma adaptação que salvou a vida dos astronautas da Apollo 13 após uma explosão num tanque de oxigênio ainda a caminho da Lua e o mérito de ter garantido o cumprimento de todos os objetivos da Apollo 17, após um acidente que inviabilizaria a continuidade da exploração da bordo do jipe lunar.

Veja as fotos a seguir e olha como as fitas estão sendo usadas:

crédito: NASA (AS17-147-22526)
crédito: NASA (AS17-135-20542)
NASA (AS17-137-20979)

Julia: E é uma baita fita resistente! Como eu moro no litoral, meu receio era de que a areia tirasse a cola da fita e descolasse tudo. Mas não. Tá coladinha 🙂 Aqui um gif deu caminhando tranquilamente com o tênis:

E você? Qual foi o uso mais inusitado que você fez da fita Silver?

Esta publicação foi feita em collab com o projeto Missão Exoplaneta 🙂

Os Dois Anéis de Quaoar.

Quando falamos em anéis em objetos do Sistema Solar você imediatamente lembrará dos exuberantes anéis de Saturno, ou talvez dos mais discretos, mas ainda assim impressionantes, anéis em torno dos gigantes Júpiter, Urano e Netuno revelados em imagens capturadas no infravermelho.

Mas três pequenos corpos do Sistema Solar, através de campanhas observacionais com protagonismo de pesquisadores e instituições brasileiros, revelaram na última década inesperados sistemas anéis a sua volta. E a última dessas descobertas foi anunciada em primeira mão pelo astrônomo Felipe Braga-Ribas em uma das lives do ciclo Abril pra Astronomia, promovido pela Sociedade Astronômica do Recife (SAR) e pelo Projeto Céu Profundo: um tênue segundo anel foi detectado em torno do objeto transnetuniano (50000) Quaoar!

A jornada de descoberta de anéis em torno de pequenos corpos começa com Chariklo, um asteroide da classe dos Centauros, que teve seu anel anunciado em um trabalho de Felipe Braga-Ribas (UTFPR) e colaboradores em 2014 – seguido pelo anúncio em 2015 do anel do planeta anão Haumea, em trabalho liderado por J. L. Ortiz (Instituto de Astrofisica de Andalucía). Mais recentemente, vimos o anúncio de um primeiro anel no objeto trasnetuniano (50000) Quaoar em trabalho publicado em 2023 por Bruno Morgado (UFRJ) e colaboradores, com dados de observações realizadas entre 2018 e 2021.

Mas se a detecção de anéis em pequenos corpos do Sistema Solar já é um resultado surpreendente que evidencia o poder das técnicas observacionais e computacionais envolvidas no processo, a surpresa, o espanto e o orgulho pela ciência brasileira dobra com o anúncio da descoberta de um segundo anel em torno de Quaoar!

Em um artigo aceito para publicação no periódico Astronomy & Astrophysics Letters (já disponível no ArXiv), Chrystian Pereira (Observatório Nacional) e colaboradores anunciam que durante observações de uma ocultação estelar por Quaoar em agosto de 2022, além da confirmação do primeiro anel já observado, os dados apontaram a existência de um segundo anel envolvendo o pequeno e distante corpo.

Quem é Quaoar?

Orbitando o Sol além da órbita de Netuno, a uma distância média que é 43 vezes maior que o raio da órbita da Terra, Quaoar é um pequeno objeto de diâmetro estimado em torno de 1100 km. Seu primeiro anel, batizado de Q1R foi descoberto em observações realizadas entre 2018 e 2021.

Suas pequenas dimensões (aproximadamente um terço do diâmetro da Lua) e sua grande distância tornam impossível fazer imagens que possam resolver detalhes de sua superfície ou mesmo definir sua forma, por isso, são usados métodos indiretos – mas muito precisos – para determinar sua geometria.

Como são realizadas as observações?

Pra deixar bem claro o tamanho do desafio: visto da Terra, Quaoar tem o diâmetro aparente de uma moeda de um real a 154 km distância. Então observações diretas não são uma opção. Mas os pesquisadores envolvidos no trabalho são capazes de computar com grande precisão sua órbita e prever quando e onde é possível observar o trânsito desse objeto em frente a uma estrela, ocultando-a. Esse pequeno e breve eclipse é capaz de nos revelar detalhes da geometria do corpo eclipsante e de quebra fornecer informações sobre a presença ou não de uma atmosfera ou de sua composição.

Representação dos resultados para o formato de Quaoar (no centro) e para a detecção dos anéis Q1R (externo) e Q2R (interno). A órbita do anel Q1R combina dados das observações recentes e das realizadas entre 2018 e 2021, publicadas por Bruno Morgado e colaboradores. A elipse verde marca a posição esperada para o limite de Roche considerando partículas de densidade 0,4 g/cm3 . A existência de anéis além do limite de Roche é inesperada e a influência de efeitos de ressonância com a rotação do corpo central e com a órbita do Weywot (um pequeno satélite de Quaoar) é considerada. A seta indica o movimento da estrela ocultada em relação a Quaoar. [créditos: C.L. Pereira e colaboradores]

Mas assim como um eclipse solar total só é visível ao longo da estreita faixa sobre a superfície terrestre onde a sombra da Lua é diretamente projetada pelo Sol, a observação de ocultações estelares por planetas ou pequenos corpos do Sistema Solar também exige que os observadores estejam posicionados no lugar e na hora certos para essa desafiadora observação. Determinar estas posições e instantes com precisão é o primeiro, mas não o único, desafio para a realização destas observações.

A imagem abaixo mostra a localização de observatórios posicionados na faixa de visibilidade da ocultação. Os pontos laranja representam estações onde o céu estava nublado durante a ocultação, os pontos pretos representam as estações onde a ocultação foi observada com sucesso e o ponto vermelho marca a estação onde a observação não detectou a ocultação. A linha sólida representa o limite da sombra de Quaoar e as linhas pontilhadas delimitam o contorno dos aneis Q1R e Q2R.

Posição dos observatórios envolvidos na aquisição de dados da ocultação da estrela Gaia DR3 4098214367441486592 pelo objeto trasnetuniano Quaoar [créditos: C. L. Pereira e colaboradores]

Limites na sensibilidade dos instrumentos e meteorologia desfavorável são o grande obstáculo para uma observação que exige grande precisão e sensibilidade instrumental. Por sorte, a faixa de ocultação cobria também o arquipélago do Havaí, um dos melhores sítios para observação astronômica do hemisfério norte e lar dos observatórios Gemini Norte, de 8.1m de abertura e CFHT (Canada-France-Hawaii Telescope) de 3.6m. Estes telescópios de grande abertura e com instrumentos de grande sensibilidade foram capazes de resolver a presença do tênue segundo anel de Quaoar.

E quais os resultados?

Os telescópios apontados para a estrela Gaia DR3 4098214367441486592 esperavam ver o brilho da estrela ser atenuado pela passagem de Quaoar, da mesma forma que a passagem da Lua eclipsa o brilho do Sol em um eclipse solar.

Comparando a variação do brilho da estrela em observações realizadas em diferentes posições é possível traçar o contorno do objeto eclipsante. Mais duas breves quedas no fluxo luminoso eram esperadas antes e após a ocultação pelo corpo central, causadas pelo já conhecido anel Q1R, envolvendo Quaoar a uma distância média de 4100km. A surpresa veio de outra sutil queda de fluxo encontrada nos dados numa posição intermediária entre Quaoar e o anel Q1R.

Dados do observatório Gemini Norte no infravermelho próximo (filtro z’) mostram as variações no fluxo luminoso medido da estrela e de Quaoar. A queda profunda na parte central do gráfico corresponde ao intervalo em que Quaoar eclipsou a estrela e as pequenas reduções de fluxo observadas pouco antes e pouco depois da ocultação revelam a presença dos anéis. [créditos: C.L. Pereira e colaboradores]

Esta sutil, mas perceptível, queda no fluxo antes e depois da ocultação principal é suficiente para revelar a presença de um segundo anel, orbitando Quaoar a 2500 km de distância.

As curvas de luz obtidas com os telescópios Gemini Norte e CFHT são coerentes com a existência de um segundo anel em torno de Quaoar. [créditos: C. L. Pereira e colaboradores].
O conjunto de dados dos observatórios que realizaram com sucesso a observação da ocultação estelar por Quaoar revela também a diferença de desempenho dos grandes telescópios Gemini Norte e CFHT no monte Mauna Kea no Havaí.

A análise dos dados da observação permitem não apenas caracterizar Quaoar e seus anéis, mas abre também as portas para discutir a existência destas estruturas numa região além do limite de Roche clássico, onde se esperaria que essas partículas se aglutinassem formando um satélite. Efeitos de ressonância com o período de rotação de Quaoar e com seu pequeno satélite Weywot e a ocorrência de colisões mais elásticas entre as partículas dos anéis são fatores que podem contribuir para a existência e longevidade de anéis além do limite de Roche e o sucesso nos métodos usados em sua detecção podem significar que outros sistemas similares possam ser encontrados em futuras observações. E esperamos que mais uma vez a presença e o protagonismo brasileiro sigam fazendo a diferença.

Tesouros do Céu Austral.

No século XVII o astrônomo francês Charles Messier compilou um célebre catálogo de objetos astronômicos de aparência difusa, incluindo verdadeiras joias que até hoje atraem o fascinado olhar de astrônomos amadores ou os poderosos equipamentos de observatórios profissionais. Mas o catálogo de 110 objetos (alguns foram incorporados após a morte de Messier) nebulosos – que inclui a galáxia de Andrômeda (M31), a Grande Nebulosa de Órion (M42), a Nebulosa do Anel (M57) e outros objetos que povoam a calçada da fama da astronomia – deixa de fora alguns objetos belos e tão brilhantes que podem ser facilmente vistos através de pequenos telescópios, binóculos ou até a olho nu no céu do hemisfério sul.

Um céu ricamente estrelada, com uma faiza nebulosa cruzando a diagonal do canto inferior esquerdo até o canto superior direito. Há regiões mais densas, com concentrações de estrelas destacando-se e pequenas manchas coloridas variando do rosa ao azul distribuídas ao longo da diagonal esfumaçada.
A imagem acima mostra a riqueza do céu austral nas vizinhanças do Cruzeiro do Sul. Esta é uma exposição única de 30 segundos capturada com câmera DSLR numa montagem motorizada. Nenhuma técnica avançada de processamento de imagens astronômicas foi utilizada e a imagem reproduz aproximadamente a visão a olho nu sob um céu preservado da poluição luminosa (escala de bortle 8). [Imagem: Wandeclayt Melo/@ceuprofundo]

A explicação para a omissão desses objetos no catálogo Messier é simples: Vivemos numa Terra esférica e esses objetos não são observáveis a partir da Europa.
A exuberante nebulosa de Eta Carinae, o imponente aglomerado globular Omega Centauri e até galáxias inteiras como as Nuvens de Magalhães são um tesouro oculto para os habitantes das latitudes mais altas no hemisfério norte, mas se revelam em todo o seu esplendor para os olhos e telescópios do sul.

Mas para encontrar esses tesouros um primeiro passo é fundamental : Afaste-se da poluição luminosa das áreas urbanas. Busque áreas rurais ou suburbanas e evite qualquer iluminação excessiva apontada para o céu ou visível diretamente de seu ponto de observação. Quanto mais escuro o ambiente, melhor será a sua experiência e mais destacados os objetos astronômicos aparecerão, em contraste com o fundo do céu.

Agora, afastados da poluição luminosa, podemos iniciar a caça ao tesouro. Comece identificando a constelação de Crux, o Cruzeiro do Sul.
Visível de todo o Brasil e facilmente reconhecível mesmo em céus urbanos, o Cruzeiro do Sul é um excelente ponto de partida para iniciar o reconhecimento do hemisfério sul celeste. Após identificarmos o Cruzeiro e suas cinco estrelas mais brilhantes – as quatro estrelas nas pontas dos braços da cruz, mais a “intrometida” – encontramos a leste duas estrelas muito brilhantes: alfa e beta da constelação do Centauro, ou alfa e beta centauri.

Carta da região circunvizinha ao Cruzeiro do Sul, gerada com o software Cartes du Ciel (Sky Charts) versão 4.2.1. O software é aberto e gratuito e está disponível para download em https://www.ap-i.net/skychart/. Compare com a fotografia mais acima.

Utilizando uma boa carta celeste ou um aplicativo de celular (não vamos indicar nenhum aplicativo em particular, porque quase todos cumprem muito bem o seu papel) continue explorando o céu ao redor do Cruzeiro. Identifique mais a oeste as constelações de Carina e Vela. Ao sul, a Mosca. Veja também como a constelação do Centauro envolve a Cruz a leste, norte e oeste.

Se você estiver num local realmente escuro, olhando para essas regiões do céu, perceberá algumas manchas difusas no céu. Um longa faixa clara – a Via Láctea – se estende de leste a oeste. Pequenas regiões nebulosas pontuam essa faixa e são melhor percebidas se não as observarmos diretamente. Tente olhar para um ponto próximo e usar o canto do olho para perceber melhor essas manchinhas nebulosas. Essa técnica de visão periférica é algo que usamos também ao observar objetos mais tênues através da ocular do telescópio.

Você perceberá dezenas desses pontos. São nebulosas, galáxias e aglomerados estelares. Perceptíveis a olho nu como pequenas manchas, mas que revelam sua verdadeira natureza e todo seu esplendor quando observamos através de binóculos e telescópios.

Esse é um excelente primeiro passo na exploração dos tesouros do céu profundo ocultos no céu austral. Visite e revisite estes objetos e venha aqui compartilhar conosco!

O Céu de Janeiro/2023

O ano de 2023 se inicia com todos os planetas acima do horizonte no início da noite.

Mercúrio, a caminho da conjunção inferior (quando o planeta encontra-se entre a Terra e o Sol) no dia 07/01, só poderá ser visto pelos observadores mais afortunados que tenham o horizonte oeste desobstruído e livre de nuvens nos primeiros dias de janeiro. Na última semana de janeiro, o planeta mais interno de nosso Sistema Solar volta a ser visível antes do amanhecer, atingindo a máxima elongação a oeste no dia 30/01.

Você não vai notar, mas no dia 4 de janeiro a Terra atinge o periélio, a ponto de sua órbita mais próximo do Sol, a uma distância de pouco menos de 147,1 milhões de km. Isso é imperceptível para nós, já que a variação entro o periélio e o afélio (o ponto da órbita mais distante do Sol) é muito pequena. A órbita terrestre é de baixa excentricidade, quase circular. É bom lembrar que as estações do ano são causadas pela inclinação do eixo de rotação da Terra e não tem nenhuma relação com essa variação de distância (basta lembrar que enquanto é verão em um hemisfério é inverno no outro e vice-versa).

Vênus seguirá visível ao entardecer por todo o primeiro semestre, atingindo a elongação máxima a leste somente em junho.

Uma bela, mas desafiadora, conjunção ocorrerá no fim da tarde do dia 22/01: Vênus e Saturno se encontrarão com menos de meio grau de separação, o suficiente para serem vistos juntos na ocular do telescópio. O desafio está na posição dos planetas, muito baixos sobre o horizonte oeste ao pôr do Sol.

Com menos de meio grau separando Vênus e Saturno no dia 22/01, será possível observar os dois astros simultaneamente na ocular do telescópio.

A conjunção entre Vênus e Saturno no dia 22/01 acontece com o céu ainda claro e com os astros já bem baixos sobre o horizonte oeste. A observação será desafiadora. Bônus pra quem também conseguir observar a delgada Lua, com menos de 2% de sua face visível iluminada. [Simulação: Stellarium/@ceuprofundo]

Para os observadores dos Objetos do Céu Profundo, as Nuvens de Magalhães, o Complexo de Carina com suas regiões de emissão e aglomerados estelares surgem em todo seu esplendor já no início da noite. Galáxias como M83 e NGC 5128 (Centaurus A) também aguardam para ser observadas e imageadas. E não se esqueçam dos colossais aglomerados globulares 47 Tucanae e Omega Centauri.

Cometas

Cometa C/2022 E3 (ZTF) em imagem de julho/22 utilizando telescópio robótico de o,4m da rede LCO [Wandeclayt m./@ceuprofundo]

Você provavelmente vai ver imagens do cometa C/2022 E3 (ZTF) circulando. Aqui no Brasil as melhores condições de observação em janeiro são para as regiões Norte e parte do Nordeste e Centro-Oeste. Para latitudes mais ao sul, sua posição é desfavorável e somente em fevereiro teremos boas condições para observá-lo de todo o Brasil. Com direito a conjunção com Marte e Plêiades!

Posição do cometa C/2022 E3 (ZTF) ao se aproximr do periélio na constelação da Coroa Boreal na madrugada de 12/01 (Simulação para São José dos Campos-SP, Stellarium/@ceuprofundo).
Posição do cometa C/2022 E3 (ZTF) ao se aproximr do periélio na constelação da Coroa Boreal na madrugada de 12/01 (Simulação para Recife-PE, Stellarium/@ceuprofundo).
DataHoraEvento
01/01Lua a 1º de Urano
02/01
03/01Lua em Conjunção com Marte (Máxima aproximação <0.5º, não visível no Brasil)
04/0113:17
Terra no Periélio (147,099 milhões de km).
Aniversário de nascimento de Isaac Newton.
05/01
06/0120:07Lua Cheia
07/01Mercúrio em conjunção inferior (Não observável).
08/01
09/01
10/01
11/01
12/01Cometa C/2022 E3 (ZTF) no periélio (1.11 UA).
13/01
14/0123:10Lua Minguante
15/01
16/01
17/01
18/01
19/01
20/01
21/0117:53Lua Nova
22/01Conjunção entre Vênus e Saturno ao entardecer (separação <0,5º).
23/01
24/01
25/01
26/01
27/01
28/0123:32Lua Crescente
29/01
30/01Mercúrio em máxima elongação a oeste (Visível ao amanhecer)
31/01

Operação Astrolábio – Novos Rumos para Alcântara.

O Veículo HANBIT-TLV, montado na plataforma de lançamento CLS (Coalesced Launch System), durante a preparação para o lançamento na Operação Astrolábio. [imagem: INNOSPACE/@ceuprofundo]

Desde sua criação, o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), tem servido com excelência às demandas do Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE), fornecendo infraestrutura e apoio ao lançamento dos veículos suborbitais brasileiros. Esta infraestrutura é fundamental para o programa brasileiro de experimentos em microgravidade, através do lançamento de veículos suborbitais nacionais. Brevemente o centro dará também suporte a operações nacionais de satelitização com o Veículo Lançador de Microssatélites VLM – em desenvolvimento pelo Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) com participação da indústria nacional.

Área de Preparação e Lançamento do Centro de Lançamento de Alcântara – CLA

Posicionado numa posição privilegiada, com baixa densidade demográfica, baixo fluxo de tráfego aéreo, sem ocorrência de terremotos ou furacões e localizado apenas 2º ao sul da linha do equador – uma grande vantagem para inserção de satélites em órbitas de baixa inclinação – o CLA tem potencial para atrair também operadores internacionais de veículos espaciais. E este potencial começa a se materializar com a assinatura do contrato com a startup coreana INNOSPACE, para o primeiro lançamento de um veículo espacial privado nas instalações do CLA.

Este novo capítulo na história do CLA – a caminho da implementação do que será o Centro Espacial de Alcântara (CEA) – consolidará Alcântara como um importante espaçoporto internacional. As operações privadas no Centro, aumentarão a cadência de lançamentos, elevando o nível de prontidão e capacitação das equipes e meios utilizados nas atividades de apoio, preparação e lançamento de veículos espaciais. Um ganho valioso para o Centro, mas que também se reverte em fomento à indústria aeroespacial brasileira e ao desenvolvimento regional em Alcântara através da injeção de recursos na economia local e na geração de empregos diretos e indiretos.

O HANBIT-TLV posicionado verticalmente pela primeira vez na plataforma de lançamento. [imagem: INNOSPACE/@ceuprofundo]

Mas a inovação não vem somente na abertura do CLA a empresas privadas. A empresa INNOSPACE (que traz a inovação estampada em seu nome e em seu slogan: Innovation for Space. Space for Innovation.”) realiza na operação Astrolábio o primeiro teste de seu motor de propulsão híbrida HyPER15 – um motor com propelente sólido a base de parafina e oxigênio líquido como oxidante, capaz de produzir 150 quilonewtons de empuxo. A tecnologia inovadora permite construir motores simples, baratos e seguros com controle de empuxo, fundamentais para a inserção precisa de satélites em órbita. A qualificação do motor HyPER15 num voo suborbital do foguete HANBIT-TLV (Test Launch Vehicle) será a luz verde para o desenvolvimentos da família de lançadores de pequenos satélites (SSLV) HANBIT em suas versões Nano, Micro e Mini, atendendo a demanda atual do mercado espacial, por lançadores para satélites menores e mais leves e mais baratos.

Integração do veículo HANBIT-TLV no Prédio de Preparação de Propulsores do Centro de Lançamento de Alcântara. [imagem: INNOSPACE/@ceuprofundo]

Sobre a operação de lançamento, o Dr. Soojong Kim, CEO da INNOSPACE, revela seu entusiasmo:

Estamos muito empolgados para fazer nosso voo espacial inaugural aqui no Centro de Lançamento de Alcântara. Esse é um momento histórico para todos nós. É a primeira vez que uma empresa coreana realiza um lançamento fora de seu território e também somos a primeira empresa estrangeira lançando em território brasileiro. O HANBIT TLV é um lançador suborbital transportando uma carga útil brasileira e empregando um motor híbrido de 150 quilonewtons de empuxo – o maior a ser usado em um SSLV – e será lançado este mês. Estamos encantados pela beleza de Alcântara e pela hospitalidade brasileira, especialmente por parte da Força Aérea Brasileira e pelo governo do Brasil. Esperamos desenvolver essa relação e construir uma sólida parceria para nossas futuras operações.” Soojong Kim, CEO da INNOSPACE.

Aqui no Céu Profundo também estamos entusiasmados com a operação e seguiremos acompanhando a campanha de lançamento e manteremos informações atualizadas em nosso Twitter e no Instagram. Aproveite para nos seguir e não perder nenhum detalhe deste momento histórico.

Integração e testes do SISNAV (Sistema Inercial de Navegação), carga útil nacional embarcada no HANBIT-TLV e desenvolvida pelo Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE) – órgão do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA). [imagem: INNOSPACE/@ceuprofundo]
Teste de elevação do veículo HANBIT-TLV na Plataforma de Lançamento. Ao fundo, a TMI (Torre Móvel de Integração). [imagem: INNOSPACE/@ceuprofundo]
Transporte do HANBIT-TLV para a plataforma de lançamento CLS. [imagem: INNOSPACE/@ceuprofundo]
Equipe da INNOSPACE após a primeira instalação do HANBIT-TLV no lançador. [imagem: INNOSPACE/@ceuprofundo]

Cadê a Fosfina?

Imagem de Vênus, com espectro sobreposto, mostrando linhas de absorção do ozônio (O3) na atmosfera da terrestre e sem indicação da presença de fosfina (PH3). – [Imagem produzida por Wandeclayt M. com dados da espaçonave Messenger, durante seu segundo sobrevoo a Vênus em junho de 2007. A imagem é uma composição colorida RGB utilizando os canais de 433.2nm, 579.9nm e 748.7n do instrumento MDIS, capturados quando a nave passava a 66 mil km do planeta].

Em 2021, o anúncio da detecção de traços do gás fosfina (PH3) na atmosfera do planeta Vênus, apontada por dados do rádio observatório ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array), causou euforia na comunidade científica.

Antenas do radio observatório ALMA (Atacama Large Millimeter/submillimeter Array) no norte do Chile. Com dados desde observatório, um grupo publicou em 2021 a descoberta de uma abundância acima da esperada de moléculas de fosfina na atmosfera de Vênus. [imagem: ESO/B. Tafreshi]

A abundância de fosfina reportada inicialmente (20 partes por bilhão) era anormalmente alta e sua origem não poderia ser facilmente explicada por processos conhecidos. A euforia vem do fato da fosfina ser um biomarcador – uma molécula que pode estar associada ao metabolismo de seres vivos – que na Terra é formada por matéria orgânica em decomposição, e seu excesso, se confirmado, poderia significar a presença de vida na atmosfera de Vênus. Uma hipótese ousada que precisaria de dados muitos robustos para suportá-la.

O trabalho de Martin Cordiner, do Goddard Space Flight Center, e colaboradores, aceito para publicação no periódico Geophysical Research Letters.

Mas os dados robustos não vieram. Após a divulgação do resultado, uma recalibração dos dados do ALMA levou a uma estimativa muito mais modesta: de 1 a 7 partes de fosfina por bilhão. Algo muito mais condizente com processos naturais, como atividade vulcânica e outros processos que não envolvem metabolismo de seres vivos.

Cuidadosas observações realizadas em seguida, pelo recém aposentado telescópio infravermelho SOFIA – um telescópio de 2.7m de diâmetro operando embarcado em um Boeing 747 modificado da NASA – deram origem a um trabalho publicado por Martin Cordiner do Centro Espacial Goddard, e colaboradores, estabelecendo um limite superior para a abundância de fosfina venusiana: a substância não foi detectada, e caso ela esteja presente na atmosfera do planeta, não deve exceder as 0.8 partes por bilhão na faixa entre 75 e 110 km de altitude.

SOFIA (Stratospheric Observatory for Infrared Astronomy) – Um telescópio infravermelho de 2,7m de diâmetro (2,5m de diâmetro útil), aerotransportado em um Boeing 747 adaptado. Uma cooperação entre as agências espaciais dos EUA (NASA) e Alemanha (DLR).

Durante sua vida útil, o observatório SOFIA operou em uma condição privilegiada: voando entre 38000 e 44000 pés de altitude, seu telescópio se colocava acima de 99% da atmosfera terrestre e de seus efeitos na absorção da reveladora radiação infravermelha. Sua mobilidade também era uma grande vantagem, permitindo observar eventos transientes como eclipses e trânsitos de objetos do Sistema Solar, mesmo quando esses só fossem visíveis sobre o oceano ou outras regiões onde não há observatórios.

Os dados do SOFIA vão na direção do que muitos esperavam e reforça a ideia de que o resultado publicado em 2021 foi fruto de dados mal calibrados. Este é um processo comum na ciência: um trabalho pode chegar em conclusões incorretas por falhas em seus métodos ou em seu conjunto de dados, mas análises e novas observações posteriores podem mostrar essas inconsistências e corrigir esses resultados.

Operação Santa Branca – Sucesso no Lançamento de Foguete VSB-30 em Alcântara.

Foguete VSB-30 é lançado com sucesso a partir do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) na Operação Santa Branca. Este é o 6º VSB-30 lançado a partir do CLA. [imagem: Divulgação/Agência Espacial Brasileira/Força Aérea Brasileira].

Menos de 12 meses após o sucesso da Operação Cruzeiro, que realizou o primeiro voo do projeto de veículo hipersônico 14-X, acelerado por um foguete VSB-30 realizando a função de Veículo Acelerador Hipersônico (VAH), a Força Aérea Brasileira (FAB) e a Agência Espacial Brasileira (AEB) anunciam o sucesso de mais uma operação no Centro de Lançamento de Alcântara.

O VSB-30 é um veículo suborbital de dois estágios, da família de foguetes de sondagem brasileiros, com capacidade para transportar cargas úteis de até 400kg em voos com apogeu nominal de 250 km com tempo de voo superior a 6 minutos acima dos 100km de altitude, conforme dados do Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE) 2012-2021 e de apresentação do DCTA no COPUOS – Comitê das Nações Unidas para o Uso Pacífico do Espaço (2014).

O veículo VSB-30 deixa o lançador para o voo do qualificação da Plataforma Suborbital de Microgravidade (PSM). [imagem: Divulgação/Força Aérea Brasileira/Agência Espacial Brasileira]

O VSB-30 é o primeiro veículo espacial brasileiro a receber certificação de tipo, garantindo confiabilidade e rastreabilidade nos processos de produção deste foguete que além de atender o programa espacial brasileiro é utilizado pelo DLR (Centro Aeroespacial Alemão) para lançamentos suborbitais que atendem o programa europeu de experimentos em ambiente de microgravidade, substituindo os foguetes britânicos SKYLARK, descontinuados em 2005. A gerência do projeto VSB-30 cabe ao Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), subordinado ao Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA). O IAE é responsável pela preparação e integração do veículo, pelo carregamento dos motores, por toda a campanha de ensaios e pela coordenação geral e técnica da operação.

A Operação Santa Branca


De acordo com a AEB a Operação Santa Branca tinha como objetivo qualificar em voo a Plataforma Suborbital de Microgravidade produzida pela empresa brasileira Orbital Engenharia. Com a nacionalização deste componente, o veículo VSB-30 passa a ser um foguete 100% nacional e garante autonomia para que o Brasil ofereça este serviço para clientes que necessitem voos suborbitais que proporcionam 6 minutos em ambiente de microgravidade .

Conversamos com representantes da AEB, do INPE e da Orbital Engenharia sobre o sucesso da missão e sobre sua importância para o Programa Espacial Brasileiro e para a independência científica e tecnológica do Brasil.

Presidente da Agência Espacial Brasileira, Coronel Carlos Moura, inspeciona a carga útil recuperada após o voo do VSB-30 na Operação Santa Branca. [imagem: Divulgação/AEB].

No bicentenário da Independência, buscamos a Independência no espaço.

Sobre a importância da nacionalização de todos os componentes do VSB-30, o presidente da AEB, Coronel Carlos Moura nos conta : “O Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE 2022-2031) preconiza a busca da “não dependência”. Portanto, desenvolver, no País, a capacidade de conceber, projetar, produzir e operar os componentes e os sistemas do VSB-30 alinha-se com esse objetivo. Traz mais flexibilidade para a realização de operações de forma autônoma e amplia a possibilidade de o Brasil participar do mercado espacial com seus institutos de pesquisa e desenvolvimento e o setor privado.

O presidente da AEB ressalta ainda a importância do programa de microgravidade para o desenvolvimento da ciência nacional e para impulsionar a indústria aeroespacial brasileira: “O Brasil é um dos poucos países com capacidade de realizar operações suborbitais em ambiente de microgravidade (imponderabilidade). O Programa de Microgravidade, conduzido pela AEB, é uma maneira de fomentar a participação de nossas instituições nesse segmento, tanto para pesquisas científicas, como para desenvolvimentos tecnológicos. Há interesse nacional e internacional nesse tipo de experimentação em microgravidade, como, por exemplo, pelo setor de fármacos. Assim, uma vez estabelecida a capacidade interna de organizar e realizar operações desse tipo, empregando veículo e infraestrutura de solo nacionais, fica-nos viável promover a inserção do País no mercado internacional via, principalmente, a exploração dessas atividades pelo setor privado.

Dr. Chen (INPE) analisa o experimento SLEM (Solidificação de Ligas Eutéticas em Microgravidade) após voo da Operação Santa Branca. [Imagem: Divulgacão/Força Aérea Brasileira/INPE]

A Carga Útil


O Dr. Chen An, da Divisão de Materiais do INPE nos conta que o voo do VSB-30 permite a “realização de experimentos em condições de microgravidade (imponderabilidade) para o estudo de fenômenos físicos sem a ação resultante da força da gravidade terrestre“. O Dr. Chen é o coordenador de um experimento embarcado como carga útil na Operação Santa Branca. O SLEM (Solidificação de Ligas Eutéticas em Microgravidade) é um experimento que realiza a fusão de metais em um forno embarcado no foguete e em seguida solidifica a amostra durante o período em que o veículo atinge as condições de microgravidade.

O sucesso na qualificação da PSM foi o elemento determinante para atingir as condições de voo requeridas pelo experimento do Dr. Chen. Após o voo, com apogeu de 227km, o êxito na recuperação da carga útil depois de sua queda no oceano a 185km da costa permitiu o resgate do experimento, garantindo a possibilidade de análise em laboratório das amostras solidificadas em microgravidade.

Sobre a PSM, conversamos com Célio Vaz, Diretor da Orbital Engenharia que nos conta: “A Plataforma Suborbital de Microgravidade PSM, possui a função de viabilizar a realização de experimentos científicos e tecnológicos no espaço, em um ambiente, proporcionado pela própria plataforma, que chamamos de microgravidade. A PSM representa um marco importante no desenvolvimento das tecnologias espaciais no Brasil, pois ela torna possível a nosso País realizar pesquisas no espaço de modo independente e, também, oferecer estes serviços no mercado internacional.

Ações de Educação e Divulgação Científica.

Além das ações diretamente ligadas ao lançamento, o Plano Nacional de Atividades Espaciais prevê ainda ações de sensibilização da opinião pública em relação à temática espacial. Neste sentido, nós do Projeto Céu Profundo demos nossa contribuição conduzindo sessões de observação telescópica em escolas e na Praça da Matriz, no centro histórico de Alcântara, complementando a programação de palestras ministradas por representantes da AEB, do INPE e da Secretaria de Educação de Alcântara.

O Projeto Céu Profundo em parceria com a Escola Caminho das Estrelas e o Museu Histórico de Alcântara promoveu duas noites de observação do céu, apresentando os planetas Júpiter e Saturno através de telescópios num evento aberto à comunidade na Praça da Matriz em Alcântara – MA. O evento teve participação da AEB, do INPE e da Secretaria Municipal de Educação de Alcântara.
A notável presença de público nas duas noites de observação conduzidas pelo Projeto Céu Profundo e viabilizadas pela Escola Caminho das Estrelas e pelo Museu Histórico de Alcântara evidenciam o interesse por da população de Alcântara por temas espaciais.

A complexa operação de lançamento envolveu diversas organizações, a começar pelo Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), sede da operação, e incluindo o IAE (fabricante do veículo), IFI (órgão de certificação), Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (rastreio radar), Orbital (fabricação da PSM), INPE (experimento embarcado), os esquadrões aéreos 1º/8ºGAv e 7º/8º GAv (recuperação da carga útil), 3º/7º GAv (esclarecimento e patrulha) e do PARA-SAR (recuperação da carga útil).

A sinergia no operação conjunta de todos esses atores evidencia que o Espaçoporto de Alcântara tem plena capacidade de oferecer com segurança e excelência serviços de infraestrutura e apoio para lançamentos espaciais, trazendo para o Brasil a possibilidade de exploração de um crescente e exigente mercado na Nova Era Espacial.

O Telescópio Espacial Spitzer

Muito antes do poderoso Telescópio Espacial James Webb desdobrar-se no espaço e apontar seu colossal espelho de 6,5m para planetas, nebulosas e galáxias, um pequeno telescópio espacial, com espelho de modestos 0,85m de diâmetro expandia nossa visão dos céus, observando estrelas nascendo e morrendo, nuvens moleculares, exoplanetas, galáxias com núcleos ativos e muitos outros objetos que guardam informações importantes na radiação infravermelha que – absorvida por nossa atmosfera – é completamente inacessível aos telescópios construídos no solo.

Seu nome é uma homenagem ao astrônomo Lyman Spitzer Jr, que em 1946, mais de uma década antes do lançamento do Sputnik – o primeiro satélite artificial, lançado pela União Soviética em 1957 – defendeu a ideia da construção de telescópios orbitais. Spitzer argumentou que a grande contribuição de um telescópio espacial não seria complementar nossa visão corrente do Cosmos, mas sim descobrir novos fenômenos sequer imaginados, realmente expandindo nosso conhecimento do universo e abrindo novas fronteiras para a pesquisa.

Lançado em 25 de agosto de 2003 e projetado para uma vida útil mínima de 2,5 anos, o telescópio espacial Spitzer manteve-se em funcionamento prestando bons serviços à astronomia por longos 16 anos de operação. Embora sua operação nominal dependesse de um sistema refrigerado a hélio líquido que se exauriu após 5,5 anos, foi possível continuar operando o telescópio em um regime de funcionamento restrito a frequências mais próximas do visível após o esgotamento do gás refrigerante.

Faixas de cobertura de comprimentos de onda do espectro eletromagnético dos telescópios espaciais Hubble, James Webb e Spitzer. [NASA/STScI. Traducão: Wandeclayt/Céu Profundo]

E mesmo após o término de sua vida operacional o Spitzer continua contribuindo com a ciência. Os dados coletados durante seus 16 anos de operação ainda alimentam pesquisas como a da astrônoma Yanna Martins-Franco, do Observatório do Valongo (OV/UFRJ) que utiliza em seu trabalho dados de galáxias luminosas em infravermelho observadas pelo Spitzer e disponíveis em seu banco de dados.

As galáxias NGC 5394 e 5395 formam o sistema de galáxias em interação ARP 84. Nesta imagem combinamos dados dos 4 canais do instrumento IRAC do Telescópio Espacial Infravermelho Spitzer.

O sistema de galáxias em interação ARP 84 (formado pelas galáxias NGC5394 e NGC5395) faz parte da amostra estudada por Yanna. Usamos dados nas quatro faixas do infravermelho capturadas pelo Spitzer através do instrumento IRAC (Infrared Array Camera) para compor esta imagem da ARP84. Como estas faixas estão fora do espectro visível, é preciso atribuir cores artificialmente a esses dados. Essa atribuição de cores, apesar de arbitrária, procura seguir um critério: aos comprimentos de onda mais longos são atribuídos aos tons mais avermelhados e os mais curtos aos azulados. Assim, o vermelho corresponde a emissão de estruturas mais frias, como a poeira que apareceria escura numa imagem em luz visível, mas que aparece em vermelho brilhante na imagem composta.

IRAC foi o único dos instrumentos que continuou em operação após o esgotamento do hélio líquido e embora os detectores operando em faixas mais longas -em 5,8 e 8,0 mícrons – estivessem quentes demais para realizar observações cientificamente úteis, os canais operando em 3,6 e 4,5 mícrons puderam funcionar com alto desempenho até a desativação do telescópio em 30 de janeiro de 2000.

E se você tem curiosidade em acessar os dados e construir suas próprias imagens com o telescópio Spitzer, a dica é navegar pelo IRSA – InfraRed Science Archive onde dados do Spitzer e de outros telescópios infravermelhos podem ser acessados e visualizados através de diversas interfaces de acesso.

Página inicial do NASA/IPAC InfraRed Science Archive, onde dados de vários telescópios infravermelhos podem ser acessados e visualizados.

LCO – Guia do Participante

Parabéns! Você está participando do programa LCO/MCTI Imagens do Céu Profundo e terá 1h de tempo de observação em telescópios robóticos de 0,40m de abertura, equipados com imageadores (imageador é um dos nomes que usamos para sensores astronômicos que produzem imagens, mas tudo bem se você chamar de câmera) de alto desempenho.

O programa é coordenado pelo Observatório Nacional e tem a nossa participação como tutores, ajudando na escolha de alvos e no uso dos softwares de processamento de imagens.

Para entender como telescópios equipados com imageadores produzem suas imagens (Isso vale para os telescópios do LCO, para Hubble, para o James Webb e para qualquer telescópio dedicado a pesquisa) você pode começar por esse vídeo:

Agora vamos a um passo a passo de como selecionar os alvos, solicitar as observações e transformar os dados em imagens!

1. O que é o LCO?

A rede Las Cumbres Observatory integra um conjunto telescópios em sítios localizados no Havaí, Texas, Chile, Ilhas Canárias, África do Sul e Austrália. Há também um sítio em Israel, com um telescópio de 1m de diâmetro que não faz parte de nosso programa. O LCO disponibiliza dados de observação e tempo de uso de telescópios para atividades de educação e divigulgação, dentro do programa 100 horas para 100 escolas. É nessa iniciativa que o programa LCO/MCTI se encaixa.

2. O que posso observar?

O nome do projeto é “Imagens do Céu Profundo” e traduz bem uma fusão que os telescópios de 0,40m desempenham muito bem: observar objetos difusos fora do Sistema Solar (os objetos do Céu Profundo). Mas também é possível fazer imagens de planetas e pequenos corpos do sistema solar (cometas, asteroides, planetas anões) e objetos estelares. No entanto, imagens com tempos de exposição longos de objetos muito brilhantes causam saturação no sensor e devem ser evitados.

3. E como escolher objetos de Céu Profundo para observar?

O astrônomo francês Charles Messier compilou no século 18 um catálogo de 110 objetos de aparência nebulosa que poderiam ser confundidos com cometas. Messier era um caçador de cometas e seu catálogo é composto de objetos que na verdade não eram de seu interesse e que poderiam frustrar outros caçadores de cometa. O seu catálogo inclui objetos de naturezas bem distintas: aglomerados estelares abertos e globulares, nebulosas de emissão, restos de supernova, nebulosas planetárias e galáxias. Essa lista de objetos desinteressantes para Messier no século 18, são na verdade um verdadeiro baú do tesouro para astrônomos amadores de hoje: objetos luminosos e visíveis até por telescópios modestos (alguns dos objetos do catálogo Messier são visíveis inclusive a olho nu).

Nossa sugestão inicial é: pesquise os 110 objetos do catálogo Messier. Os objetos são numerados sequencialmente, recebendo o prefixo M: M1 é a Nebulosa do Caranguejo, M13 é o grande aglomerado globular em Hércules, M31 é a Galáxia de Andrômeda, M42 é a Grande Nebulosa de Órion…

Como Messier estava na Europa, há objetos de céu profundo fascinantes no hemisfério sul celeste que não eram visíveis para ele e não entraram em seu catálogo. O astrônomo amador e popularizador da astronomia inglês Patrick Moore compilou um catálogo, publicado em 1995, que complementa o catálogo Messier, com 109 objetos de céu profundo brilhantes e observáveis por astrônomos amadores que não constam do catálogo de Messier. Moore usou seu outro sobrenome para nomear o catálogo: Caldwell. E seus objetos são nomeados com o prefixo C: C63 é a Nebulosa da Hélice, C77 é a galáxia Centaurus A, C80 é o aglomerado globular Omega Centauri… Você pode buscar por esses catálogos na Wikipedia, e em seguida pode visualizar os objetos usando a ferramenta ESA SKY. O ESA SKY é uma implementação online do atlas astronômico ALADIN. Uma ferramenta indispensável em seu cinto de utilidades astronômicas.

O portal ESA SKY é uma implementação online do atlas ALADIN. Use-o para ver imagens fotográficas dos objetos de Céu Profundo e planejar suas observações.

Resumindo: pesquise com sua equipe os objetos dos catálogos Messier e Caldwell. Estude as classes de objetos, suas magnitudes e encontre suas coordenadas (Ascenção Reta e Declinação). Encontre também seu tamanho aparente (em segundos ou minutos de arco) e compare com o campo dos imageadores (30′ x 20′).

4. E como observar?

Agora que os possíveis alvos foram escolhidos é preciso saber se eles estão visíveis no período de disponibilidade do seu tempo de observação. Queremos também evitar que a Lua esteja perto do objeto, interferindo na observação. Podemos usar o simulador Stellarium para verificar essas condições. Insira a data provável da observação e procure o objeto escolhido. Verifique a hora de nascimento, de trânsito e de ocaso. Verifique também se a Lua está nas proximidades. Se tudo estiver ok, podemos passar adiante e solicitar a observação.

4.1 O Jeito Fácil!


Através do formulário rápido Our Solar Siblings – Quick Submit é possível solicitar as observações em um modo automático que não requer prática nem tampouco habilidade! Use o número de catálogo do objeto ou o nome próprio (quando existir). O sistema de buscar encontrará as coordenadas e gerenciará o tempo de exposição. Seu pedido de observação entrará na fila de requisições e tudo o que você precisa fazer é esperar pelos dados. Confira no site https://observe.lco.global/ se sua observação está na lista e qual o seu status.

4.2 O Jeito Poderoso!

https://observe.lco.global/
Aqui você vai precisar de um pouco mais de intimidade com os diversos parâmetros envolvidos, mas também vai poder ter controle em pontos que o Our Solar Siblings decidiu por você. Neste modo manual você pode definir tempos de exposição diferentes em cada filtro, pode montar mosaicos de objetos que sejam grandes demais para caber no campo de uma única imagem e pode também escolher filtros que estejam fora do padrão BVR.

Neste vídeo apresentamos o LCO Observing Portal:

5. E Como Transformo os Dados em Imagens Coloridas?

Os dados disponibilizados após a observação seguem o padrão adotado na astronomia profissional. Os asquivos são disponibilizados no formato FITS, um formato de arquivo realmente versátil e poderoso, capaz de transportar não apenas dados de imagem, mas também informações sobre o instrumento e o local de observação, sobre o objeto observado e até de incorporar um sistema de coordenadas celestes, permitindo que façamos medidas de posições (astrometria) em nossas imagens.

Recomendamos o software SAO Image DS9 para abrir os arquivos FITS e para combinar os arquivos obtidos nos filtros B (Azul), V(Verde/Visual) e R(Vermelho) em uma única imagem colorida. É um programa leve, gratuito e com interface simplificada. Temos vídeos apresentando as funcionalidades do DS9 aqui: https://www.youtube.com/watch?v=R92DeVu5zNE

6. E o que fazer com essas imagens?

Produzir imagens astronômicas é uma atividade que permite múltiplas abordagens. É possível pensar na física e na composição química dos objetos imageados, na sua morfologia, na sua nomenclatura ou puramente em seus aspectos estéticos. É uma atividade multidisciplinar por natureza e sem muita dificuldade é possível integrá-la em todos os níveis de ensino e em diverentes unidades de conteúdo dentro da BNCC. Discutimos um pouco sobre isso no vídeo seguinte:

Mas além de seu uso na sala de aula, participantes do programa Imagens do Céu Profundo precisam produzir um pequeno relatório para se tornarem elegíveis ao certificado de conclusão das atividades do programa. Essas instruções são passadas mais detalhadamente após o período de observação.

7. Meu Tempo de Observação Acabou. O Que Mais Posso Fazer Dentro do Programa?

É possível continuar acessando o banco de dados do portal LCO e trabalhando com observações já realizadas. Você não poderá solicitar novas observações, mas o banco de dados é gigante e você vai poder explorá-lo para compor novas imagens a partir dos dados arquivados.

Além disso, você pode acessar outros bases de dados astronômicos (com dados do Hubble, do James Webb e de outros grandes telescópios também!!) e usar as mesmas técnicas que aprendeu para utilizar com os dados do LCO.