Qual a Distância até aquela Estrela?

Você certamente conhece a constelação do Cruzeiro do Sul e possivelmente consegue reconhecê-la com facilidade no céu noturno, não?
Bem, talvez em um céu realmente escuro, longe da poluição luminosa das áreas urbanas, como na imagem abaixo, haja tantas estrelas visíveis que a tarefa de identificar o Cruzeiro do Sul seja um pouco mais desafiadora. Mas vamos dar uma ajudinha. Marcamos aí as 5 estrelas mais brilhantes que formam o asterismo do Cruzeiro!

E usamos a palavra “asterismo” porque a constelação do Cruzeiro do Sul, ou Crux, não se resume a essas 5 estrelas. O conceito moderno de constelação, adotado pela União Astronômica Internacional (IAU), orgão responsável pela nomenclatura oficial usada pela astronomia profissional, não é a de um “grupo de estrelas”.

A constelação na verdade é uma área do céu, com bordas bem definidas de acordo com suas coordenadas celestes. E o que a IAU define como a constelação do Cruzeiro é toda a região em verde na imagem abaixo.

Carta Celeste da Região do Cruzeiro do Sul e adjacências, criada no software Sky Charts [créditos: Wandeclayt M./@ceuprofundo]

Assim, todas as estrelas, nebulosas, aglomerados estelares ou outros objetos astronômicos vistos na região demarcada, estão na constelação do Cruzeiro.

E essas estrelas estão próximas umas das outras?

Esse é outro aspecto que precisamos discutir! As estrelas de uma constelação, não estão necessariamente próximas umas das outras. Estão apenas na mesma direção aproximada no céu, mas podem apresentar distâncias variadas entre elas.

Mas para criar um mapa tridimensional do céu, conhecendo não apenas a direção das estrelas na esfera celeste mas também suas distâncias, foi preciso esperar dois milênios.

Medindo distâncias.

A área da Astronomia que se ocupa de medir as posições dos objetos celestes se chama Astrometria e surgiu muito antes dos telescópios passarem a ser empregados para a observação do céu no século 17.

Hiparco, na Grécia do século 2 a.C, já mapeava as estrelas e o Almagesto, a grande compilação astronômica de Claudio Ptolomeu no Egito do século 2 d.C, trazia os mapas das constelações catalogadas por Hiparco e a classificação das estrelas por seu brilho (as medidas de brilho são outra atividade observacional importante: a Fotometria).

No século 16, Tycho Brahe foi um criterioso observador da era pré telescópica e suas precisas observações astrométricas do planeta Marte foram a base para que seu discípulo Johannes Kepler enunciasse as leis empíricas do movimento planetário. Empíricas porque ainda não havia uma teoria gravitacional que explicasse a natureza do movimento orbital e a geometria das órbitas descrita por Kepler era totalmente baseada nos dados observacionais.

Mas medir distâncias estava longe do que Tycho conseguiria fazer no século 16 e completamente fora do alcance do que Hiparco poderia sonhar em fazer no século 2 a.C.

O método geométrico usado hoje para medir indiretamente as distâncias estelares é conceitualmente simples e está representado no diagrama da figura abaixo. Observamos uma estrela a partir de uma posição da órbita terrestre e registramos sua posição. Seis meses depois, a Terra estará numa posição diametralmente oposta em sua órbita e, portanto, a aproximadamente 300 milhões de quilômetros distante da posição anterior. Fazemos uma nova observação e registramos o deslocamento aparente sofrido pela estrela, devido à mudança do ponto de vista de nossa observação. Chamamos esse deslocamento aparente de “paralaxe” e ele vai variar com a distância da estrela. Estrelas mais próximas apresentarão uma paralaxe maior. Estrelas mais distantes, uma paralaxe menor.

Você pode testar esse método olhando para seu dedo indicador com o braço esticado alternadamente com cada um dos olhos. Você vai perceber que o dedo vai parecer se deslocar a medida que você troca de olho ao observá-lo. Aproxime o dedo um pouco mais do rosto. O deslocamento vai parecer maior.

Mas se o método é assim tão simples, por que Hiparco e Tycho não poderiam medir a distância até as estrelas mais próximas? Aí aparecem dois problemas! O primeiro deles é que a distância até as estrelas é muito maior do que qualquer pensador da antiguidade, ou mesmo do Renascimento, se arriscou a estimar e a paralaxe estelar é muito pequena. E o segundo é que imperava o modelo geocêntrico do Universo, que acabava sendo reforçado pela falha na detecção da paralaxe estelar, afinal, se não há paralaxe, a Terra deveria ser imóvel!

A largada da corrida para medir a paralaxe estelar só é dada com o triunfo do heliocentrismo e com a compreensão do movimento orbital da Terra, graças inicialmente a Kepler e Newton. A partir do momento que tínhamos certeza que a Terra orbitava o Sol, necessariamente deveria haver alguma paralaxe a ser medida, ainda que muito pequena.

Mas quanto é uma paralaxe “muito pequena“?

Vamos introduzir mais alguns conceitos para deixar isso mais claro.
Na Astrometria usamos medidas angulares para falar da posição ou da separação entre objetos na esfera celeste ou do diâmetro aparente de alguns corpos.

Um círculo é tradicionalmente dividido em 360 partes iguais chamadas de graus (°). A separação entre o horizonte e o zênite (o ponto no céu que fica acima da sua cabeça) é de 1/4 de círculo ou de 90º. O Sol e a Lua representam no céu um diâmetro de 0,5°.

Essa divisão do círculo em 360 graus é uma herança da Babilônia e remonta a mais de 2000 anos antes de Cristo. Nesse sistema, cada grau é dividido em 60 partes chamadas “minutos de arco” (ou 60′) e cada minuto de arco é dividido em 60 segundos de arco (ou 60″). Ou seja, 1º equivale a 3600″.

Há inclusive uma unidade de distância definida a partir da paralaxe, o parsec.
Um parsec é a distância na qual um objeto exibe uma paralaxe de 1 segundo de arco, e equivale a 3,26 anos luz.

E aí está o grande desafio! Como nenhuma estrela, além do Sol, está localizada a menos de um parsec, a paralaxe a ser medida é menor que 1 segundo de arco, ou mais que 3600 vezes menor do que 1°.

Michael Perryman em the History of Astrometry aponta que as melhores observações de Tycho alcançaram uma resolução de 20 segundos de arco, bem longe da resolução necessária para medir a paralaxe estelar.

No século 18, William Herschel e sua irmã Caroline realizaram grandes descobertas com telescópios de dimensões nada modestas (mais de 1 m de diâmetro e 12 metros de distância focal). Entre as contribuições dos irmãos Herschel para a Astronomia estão a descoberta de Urano e duas de suas luas, de duas luas de Saturno e a detecção do movimento orbital em estrelas binárias. Mas eles falharam na detecção da paralaxe estelar. Não por limitações instrumentais, mas por não terem selecionado estrelas próximas o suficiente para exibir uma paralaxe mensurável.

Uma melhor seleção de estrelas candidatas a exibir uma maior paralaxe (e portanto estarem mais próximas) surge a partir de critérios sugeridos pelo astrônomo Wilhelm Struve na primeira metade do século 19: estrelas brilhantes, com grande movimento próprio (além do efeito da paralaxe, as estrelas estão realmente se movendo no céu e um movimento próprio mais rápido pode significar que a estrela está mais próxima de nós) e, no caso de estrelas binárias, estrelas que estejam bem separadas, a julgar por seu movimento orbital.[1]

Foi na década de 1830 que as primeiras medidas confiáveis de paralaxe foram finalmente publicadas. Struve anunciou uma paralaxe de 1/8 de segundo de arco para Vega (a alfa de Lira) e Friedrich Bessel encontrou uma paralaxe de 0,314 segundos de arco para a estrela 61 Cygni. Trabalhos seguidos pela determinação da paralaxe de Alfa Centauri, por Thomas Henderson em 1839.

Embora Alfa Centauri faça parte do sistema estelar mais próximo do Sistema Solar, ela está fora do alcance de observadores nas latitudes da Europa (consequências de uma Terra esférica) e foi observada por Henderson em uma campanha no Cabo da Boa Esperança.

E parou por aí?

A Astrometria seguiu muito bem, obrigado, e mapas cobrindo ambos os hemisférios celestes foram produzidos incorporando dados cada vez mais precisos de coordenadas celestes, movimento próprio e distância, até que a própria atmosfera terrestre tornou-se o principal limitante para o que poderia ser medido com telescópios instalados na superfície.

O novo salto de qualidade vem com a proposta apresentada em 1967 pelo francês Pierre Lacroute[2]: um telescópio dedicado a astrometria e fotometria em órbita da Terra, acima da atmosfera, onde poderia catalogar estrelas muito menos brilhantes e atingir precisão sem precedentes nas medidas astrométricas e cobrindo inteiramente ambos os hemisférios celestes (outra restrição encontrada pelos telescópios na superfície é a impossibilidade de observar todo o céu).

HIPPARCOS foi o primeiro satélite dedicado a astrometria. Lançado pela ESA em 1989, inaugurou uma era de alta precisão nos catálogos estelares [imagem: Agência Espacial Europeia].

A ideia culminou no lançamento do satélite Hipparcos (HIgh Precision PARallax COllecting Satellite), pela Agência Espacial Europeia (ESA) em 1989. O satélite coletou dados até 1993, dando origem ao catálogo Hipparcos, com quase 120 mil estrelas. Seus dados geraram ainda os catálogos Tycho e Tycho 2, extrapolando a marca de 2,5 milhões de estrelas catalogadas.

2,5 milhões de estrelas parece muito? E é! Mas o lançamentoo em 2013, também pela ESA, de um novo satélite astrométrico, o Gaia, multiplicou por 1000 esse número, ultrapassando 1,8 bilhão de fontes catalogadas na terceira liberação de dados da missão (Gaia data Release 3).

E como eu posso saber a distância até as estrelas do Cruzeiro?

[Vamos fazer umas continhas aqui e está tudo bem se você pular essa seção, mas garantimos que o resultado é divertido e vai valer a pena se você tentar nos acompanhar aqui.]

Os catálogos Hipparcos, Tycho, Tycho 2 e Gaia são públicos. Isso significa que qualquer pessoa pode ter acesso a todos os parâmetros de astrometria e fotometria medidos pelos satélites. É possível acessá-los usando ferramentas especializadas em operações com dados astronômicos como o TOPCAT ou através de recursos disponíveis em ferramentas de visualização de imagens e dados como o SAO Image DS9. O acesso também pode ser feito através de bibliotecas em Python ou diretamente em bases de dados como o SIMBAD.

E se você quer descobrir as distâncias até as 5 estrelas mais brilhantes do Cruzeiro (ou a qualquer estrela catalogada) é só consultar a paralaxe dessas estrelas na pesquisa básica do SIMBAD. Conhecendo a paralaxe a relação é direta:

distância (em parsecs) = 1000 * (1 / paralaxe (em milissegundos de arco)).

A multiplicação por 1000 é necessária por que a paralaxe é dada nos catálogos em “milissegundo de arco”. Se você quiser a distância em anos luz, a conversão também é imediata:

distância (em anos-luz) = 3,26 * distância (em parsecs).

Agora que você já sabe o que fazer com os dados, pode colocar a mão na massa.

Acesse a busca básica do SIMBAD (figura abaixo) e pesquise as cinco estrelas mais brilhantes da constelação do Cruzeiro do Sul: “alf cru”, “bet cru”, “gam cru”, “del cru” e “eps cru”.

Tela de pesquisa básica do SIMBAD: http://simbad.cds.unistra.fr/simbad/sim-fbasic. Insira o nome do objeto a ser pesquisado (no caso, “alfa crux”, “alf cru” ou “alp cru” correspondem a mesma estrela, a alfa do Cruzeiro do Sul).

Na janela de resultados, use o valor no campo “Parallaxes (mas)” para calcular as distâncias pelas relações que apresentamos acima. Se tudo der certo, você vai encontrar os mesmos valores apresentados na próxima seção.

Tela de resultados da busca básica do SIMBAD. Use o valor da paralaxe no campo indicado pela seta para computar a distância até a estrela consultada.

O Cruzeiro do Sul em três dimensões.

Consultando bases públicas de dados astronômicos como o SIMBAD, podemos encontrar as distâncias para qualquer estrela catalogada. E para alguns grupos de estrelas os resultados podem ser surpreendentes. Por exemplo, você imaginava que Rubídea (gama Crux) apesar de ser apenas a terceira estrela mais brilhante na constelação do cruzeiro é a que está mais próxima de nós, a apenas 88 anos-luz? Na verdade ela está mais próxima do Sol do que de qualquer uma das outras estrelas que formam a Cruz, já que a estrela seguinte, epsilon Crux, a Intrometida, está a quase 230 anos-luz de nós.

EstrelaParalaxe
(milissegundos de arco)
Distância
(anos-luz)
alp Crux (Acrux)10.13322.01
beta Crux (Mimosa)11.71278.57
gama Crux (Rubídea)36.8388.57
delta Crux (Pálida)7.1681455.07
epsilon Crux (Intrometida)14.1999229.72
Dados de paralaxe e distância das estrelas mais brilhantes do Cruzeiro do Sul. Distâncias calculadas a partir dos
dados de paralaxe acessados via SIMBAD.

Combinando os dados astrométricos do catálogo em uma visualização tridimensional, podemos evidenciar as diferenças de distância entre as estrelas que formam o asterismo da cruz na constelação.

Precisamos concordar que foi uma jornada e tanto! Há 200 anos era instrumentalmente impossível determinar a distância até as estrelas. Hoje, temos telescópios espaciais com capacidade de mapear bilhões de fontes em nossa galáxia ou até em galáxias vizinhas. E o melhor de tudo isso: todos esses dados estão a um clique de distância de você.


Para Pensar um Pouco.

  • Usando o método que apresentamos no texto, determine a distância até alfa Centauri.
  • Alfa Centauri é na verdade um sistema triplo e você pode pesquisar cada uma de suas componentes individualmente: “alf Cen A”, “alf Cen B” e “alf Cen C”. Pesquise no SIMBAD e identifique qual das componentes está mais próxima de nós.
  • O SIMBAD informa também o brilho das estrelas. Observa no campo “Fluxes” a linha iniciada por “V”. Essa é a magnitude visual do objeto. Quanto maior a magnitude, menor o brilho. Essa escala é também uma herança de Hiparco e Ptolomeu, que apresentaram as estrelas divididas em seis grandezas, ou magnitudes. As estrelas de primeira grandeza eram as mais brilhantes e as de sexta grandeza as menos brilhantes visíveis a olho nu. O sistema moderno de magnitudes é uma adaptação dessa escala. A diferença de 1 magnitude significa uma diferença de fluxo (brilho) de 2,5 vezes. Assim, uma estrela de magnitude 0 é 2,5 vezes mais brilhante que uma estrela com magnitude 1. Uma diferença de 5 magnitudes significa uma diferença de 100 vezes no fluxo (brilho). O limite de magnitude para a observação a olho nu é 6. Consulte a magnitude da estrela mais próxima do sistema alfa Cen no SIMBAD. Ela é visível a olho nu?

Código Fonte

Para reproduzir o gráfico tridimensional ou acessa o SIMBAD atráves de um script em linguagem Python, use nosso notebook disponibilizado na plataforma Google Colab:
https://colab.research.google.com/drive/1R0nHygvdFoBeDj34h-4O-JotWue_Bz0i?usp=sharing

Ao abrir o notebook, crie uma nova cópia do arquivo para que seja possível editá-la (figura abaixo). Não é necessário instalar nenhum componente localmente e toda a execução ocorre nos servidores da plataforma Google Colab. O código é bem comentado e você não precisa entender de programação para usar o script. Não requer prática nem tampouco habilidade. Qualquer criança brinca e se diverte.

Após criar uma cópia, o código será inteiramente editável e você poderá experimentar utilizar outras estrelas para consulta ou mudar os parâmetros usados na construção da animação.
Para executar o script, clique no ícone indicado pela seta (imagem abaixo) em cada bloco de código.

Os resultados são exibidos na mesma janela do código e cada bloco e executado em segundos.

Referências

Descobrindo as Leis de Kepler.

Versão beta do notebook Jupyter disponível no Google Colab.

https://colab.research.google.com/drive/1pltfcL5r1VXdzifKS95PwW4n2vGK6t45?usp=sharing

https://colab.research.google.com/drive/1K-Glo8x2r3jA3F0FJR70pbEELL1RyPT9?usp=sharing

ALERTA DE BOATO: O que é o Afélio?

Se você não recebeu uma bizarra mensagem falando sobre um nefasto “Fenômeno APHELION” em algum grupo do whatsapp, provavelmente ainda vai receber.

Captura de tela da mensagem FALSA que diz "A partir de amanhã, às 5:27, vivenciaremos o fenômeno aphelion, onde a Terra estará muito distante do Sol. Não podemos ver o fenômeno, mas podemos sentir seu impacto. Isso vai durar até agosto. Teremos um clima frio mais do que o clima frio anterior, o que afetará a gripe, tosse, falta de ar, etc. A distância da Terra ao Sol é de 5 minutos-luz ou 90 milhões de km. O fenômeno do afélio a 152 milhões de km."
A mensagem com conteúdo falso que tem circulado no whatsapp usando o termo astronômico em inglês Aphelion e com informações distorcidas.

O boato pega carona em um termo astronômico e segue destilando alarmismo e pedindo compartilhamento! Mas o que é realmente o afélio (é esse o termo em português)? E tem ele algum efeito perceptível no clima?

A órbita terrestre, como a de todos os planetas, é uma elipse, ou seja, um círculo um pouco alongado. E por ser alongada, a órbita possui um ponto mais próximo ao Sol, que chamamos de periélio, e um ponto mais distante, que chamamos de afélio. O afélio não é, portanto, um fenômeno, mas apenas um ponto de nossa órbita por onde passamos todos os anos. O boato também passa longe da realidade quando diz que o afélio vai durar de “amanhã” (não há data na mensagem) até agosto. O afélio é apenas um ponto na órbita e não um fenômeno duradouro. Em 2022 passaremos por esse ponto no dia 4 de julho. E em 4 de janeiro, passamos pelo outro ponto importante, o periélio. Mais informações sobre essas datas podem ser encontradas no site Time and Date.

A órbita da Terra, em azul na imagem, é quase circular e distância da Terra ao Sol varia apenas 1,7% em relação à média, como visto nesse gráfico gerado pelo visualizador de órbitas do Laboratório de Propulsão a Jato (JPL) da NASA. Ao contrário das órbitas de Mercúrio – a mais interna no gráfico – e a de Marte – a mais externa – que possuem excentricidade considerável. (https://ssd.jpl.nasa.gov/tools/orbit_viewer.html)

A mensagem acerta na distância em que a Terra se encontra do Sol no afélio (152 milhões de km), mas usa um valor absurdamente menor (e errado!) para o periélio, fazendo parecer que no afélio estamos muito mais distantes do Sol do que no resto do ano. Na verdade, a variação entre a distância média da Terra ao Sol e a distância no afélio e no periélio é de apenas 1,7% – o que é completamente imperceptível na prática. Os valores na tabela abaixo foram extraídos da Tabela de Dados Planetários do Centro Espacial Goddard da NASA e os valores da distância média ao Sol e do afélio e periélio da Terra estão destacados. Note que o valor de 90 milhões de km, atribuído ao periélio na mensagem, nos colocaria dentro da órbita de Vênus!

 Mercúrio  Vênus  Terra Marte Júpiter  Saturno  Urano  Netuno 
Distância Média ao Sol (106 km)57.9108.2149.6228.0778.51432.02867.04515.0
Periélio (106 km)46.0107.5147.1206.7740.61357.62732.74471.1
Afélio (106 km)69.8108.9152.1249.3816.41506.53001.44558.9
Excentricidade Orbital0.2060.0070.0170.0940.0490.0520.0470.010
Parâmetros orbitais dos planetas do Sistema Solar. fonte: https://nssdc.gsfc.nasa.gov/planetary/factsheet/

Vale lembrar também que não é o afélio que causa o inverno. Em julho, quando estaremos no inverno do hemisfério sul, será pleno verão no hemisfério norte.

As estações do ano são um efeito da inclinação do eixo de rotação da Terra em relação à sua órbita, que expõe mais diretamente um hemisfério aos raios solares do que o hemisfério oposto, de acordo com a época do ano.

Verão no Hemisfério Sul
No verão do hemisfério sul, os raios do Sol atingem mais diretamente nosso hemisfério e permanecemos iluminados por mais tempo. Os dias são mais longos e as noites são mais curtas. Ao mesmo tempo, o hemisfério norte recebe menos luz solar. A imagem acima foi produzida pelo observatório DSCOVR e mostra a face iluminada da Terra no dia 21 de dezembro de 2020. A linha tracejada marca o equador, dividindo os hemisférios. (crédito: DSCOVER/EPIC)
No inverno do hemisfério sul, os raios do Sol chegam mais inclinados ao nosso hemisfério e permanecemos iluminados por menos tempo. Os dias são mais curtos e as noites são mais longas. Ao mesmo tempo, o hemisfério norte recebe mais luz solar. A imagem acima foi produzida pelo observatório DSCOVR e mostra a face iluminada da Terra no dia 21 de junho de 2020. A linha tracejada marca o equador, dividindo os hemisférios. (crédito: DSCOVER/EPIC)

Esperamos que com esses dados e referências todos sejam capazes de ajudar a freiar mais um boato de rápida circulação nos grupos de whatsapp e possam ajudar a espalhar a boa ciência. Podem compartilhar este artigo sem moderação e estamos sempre prontos para tirar dúvidas em nossas redes sociais: sigam www.twitter.com/ceuprofundo e www.instagram.com/ceuprofundo.

Lua: Mares, oceanos e baías numa superfície desértica.

A face visível da Lua é marcada por vastas planícies escuras que contrastam com o terreno mais claro e mais acidentado do restante da superfície lunar. Apesar de não haver água no estado líquido na superfície da Lua, essas regiões recebem o nome de oceanos, mares, lagos e baías.

O mares lunares são na verdade um deserto seco e correspondem a regiões inundadas pelo basalto originado na atividade vulcânica lunar (https://doi.org/10.1029/2000JE001244) no período compreendido entre 4 e 1,1 bilhões de anos atrás(aqui é bom lembrar que no português brasileiro 1 bilhão equivale a 1.000.000.000).

A face visível da Lua (imagem da esquerda) e seu lado oculto (à direita) em mosaico composto por imagens da Lunar Reconnaissance Orbiter [crédito: NASA]

Por se tratar de regiões mais jovens do terreno, os mares exibem menos crateras de impacto que as regiões mais antigas e elevadas. Além disso, os mares possuem albedo mais baixo, refletindo menos luz e parecendo mais escuros, destacando-se – mesmo a olho nu – contra o terreno mais claro.

Os primeiros mapas a nomear acidentes do relevo lunar datam do século XVII e já registravam as planícies basálticas como mares e oceanos. Os mapas de Langrenus (1645), Hevelius (1647) e Riccioli (1651) traziam denominações distintas para os mares e para as demais formações da topografia da Lua. O sistema adotado por Riccioli é o que mais se aproxima da nomenclatura moderna, padronizada pela União Astronômica Internacional a partir da aprovação do mapa e catálogo Named Lunar Formations compilado por Mary Blagg e Karl Müller e publicado em 1935.

Mapa da Lua publicado em 1645 por Michael von Langren, o primeiro a atribuir nomes a formações da topografia lunar.
Mapa da Lua de Johanes Hevelius, publicado em 1647 na obra Selenographia.
Mapa lunar desenhado por Grimaldi e publicado por Giovanni Battista Riccioli no Almagestum Novum em 1651 [ETH-Bibliothek Zürich ]

O atlas de Blagg e Müller foi um primeiro passo na universalização da nomenclatura lunar, mas o aumento da resolução das fotografias lunares capturadas em telescópios terrestres e o mapeamento do lado oculto da Lua por espaçonaves exigiu sucessivas atualizaçoes nos mapas lunares nas décadas seguintes. Um curioso episódio seguiu o envio das primeiras imagens da face oculta da Lua pela sonda soviética Luna 3. Os cientistas soviéticos batizaram uma das raras planícies basálticas naquele lado da Lua de Mare Moscoviense, quebrando a tradição de nomear mares com nomes relacionados a àgua (Mar das Chuvas, Oceano das Tempestades…) ou a estados de espírito (Mar da Tranquilidade, Mar da Serenidade…) para o desconforto dos mais apegados à nomenclatura histórica.

A Assembleia Geral da União Astronômica Internacional (IAU General Assembly) de 1961 estabeleceu que além das regras em voga, ficasse estabelecido que: “Grandes áreas escuras são designadas por denominações em latim referentes a estados de espírito. Estes nomes são associados, de acordo com as regras de declinação e grafia do latim, aos substantivos apropriados: Oceanus, Mare, Lacus, Palus or Sinus. (As exceções Mare Humboldianum e Mare Smythii são mantidas, por estarem consagradas pelo uso). “

“Large dark areas are designated in Latin denominations calling up psychic states of minds. These names are associated, according to the Latin declination ruIes and spelling, to one of the appropriate substantives: Oceanus, Mare, Lacus, Palus or Sinus. (The exceptions, Mare Humboldianum and Mare Smythii, are preserved, due to long usage).” [XIth General Assembly. Berkeley, USA 1961]

A solução para o impasse soviético veio daí! Reza a lenda que o astrônomo Aldouin Dollfus, muito diplomaticamente, estabeleceu que o nome Mare Moscoviense estava de acordo com a regra, porque Moscou é um “estado de espírito”.

Mapa topográfico da Lua criado a partir de dados da sonda chinesa Chang-E1.

Imagens Astronômicas – Visualizando Dados de Imagem

M57 - Nebulosa do Anel
Nebulosa M57, na constelação de Lira. (Hubble/STScI/PID=12309. Processamento: Wandeclayt Melo)

É impossível conter a admiração frente a uma imagem exuberante e colorida como esta da nebulosa planetária M57. A imagem é resultado de observações realizadas pelo Telescópio Espacial Hubble utilizando canal UVIS da câmera WFC3, a mais moderna a bordo do telescópio, instalada em 2009 em sua última missão de manutenção.

Criamos esta imagem utilizando os arquivos originais do telescópio Hubble, combinando dados obtidos através de filtros que selecionam que faixas de comprimentos de onda são transmitidos ao sensor da câmera. Os filtros são necessários porque as câmeras de alto desempenho utilizadas para o registro de imagens astronômicas profissionais geram apenas imagens em tons de cinza, registrando a intensidade, mas não a cor, da luz incidente em cada pixel. As imagens coloridas são na verdade uma combinação de várias imagens individuais em tons de cinza que foram colorizadas posteriormente. Apesar de não registrar cores, estes arquivos podem carregar muito mais informações: coordenadas celestes da região imageada, características do telescópio e do sensor – incluindo parâmetros de eficiência quântica do sensor, que permitem estimar com precisão a quantidade de fótons que foi efetivamente contada por cada pixel – e camadas adicionais de dados como tabelas e arquivos de calibração. Como os formatos tradicionais de imagem não possuem provisão para transportar todos estes dados, a comunidade astronômica desenvolveu seu próprio padrão de arquivo, capaz de lidar com todas essas camadas de informação e de armazenar uma vasta gama de valores por pixel, necessária para compreender as diferenças de luminosidade que muitas vezes precisam ser registradas em uma única imagem sem perda de informação.

Um Formato de Arquivo Dedicado para a Astronomia

O formato de arquivo criado e adotado pela comunidade como padrão para dados e imagens astronômicas é o FITS – Flexible Image Transport System (documentação em https://fits.gsfc.nasa.gov/) e requer ferramentas e aplicativos especiais para sua visualização e análise.

Câmera CCD astronômica SBIG STT-8300. Este é um modelo de câmera disponível comercialmente e utilizada em telescópios de menor porte. Grandes telescópios não utilizam instrumentos comerciais e costumam integrar câmeras e outros detectores projetados especificamente para eles . [Crédito: Diffraction Limited]

Os dados no formato FITS dos telescópios espaciais e observatórios profissionais em solo são disponibilizados em repositórios públicos abertos para a comunidade científica e para a ciência cidadã. Isso significa que você pode acessar, por exemplo, o arquivo de imagens dos telescópios que integram a rede Las Cumbres Observatory (https://lco.archive.org) e localizar, baixar e processar dados reais de observação. Para isso você precisará de um aplicativo com suporte ao formato FITS e se você ainda não usa nenhum dos apresentados nesta lista https://fits.gsfc.nasa.gov/fits_viewer.html podemos sugerir algumas opções.

FITS Liberator

Uma das opções mais simples para visualizar e converter arquivos FITS para formatos de imagem tradicionais (JPEG, PNG, TIFF…) é o FITS Liberator.

Interface do FITS Liberator versão 3.0 (ESA, ESO, NASA).

O FITS Liberator é talvez a opção mais simples se a ideia é apenas visualizar e exportar os arquivos FITS para um editor de imagem tradicional. Ele permite também visualizar o cabeçalho (FITS Header) que traz informações importantes sobre o arquivo (filtros utilizados, tempo de exposição, coordenadas da imagem e do observatório, telescópio e câmera que originaram o arquivo…).
O download da versão mais recente pode ser feito em https://noirlab.edu/public/products/fitsliberator/
A versão 3.0, anterior à atual, possui alguns recursos úteis que foram suprimidos na versão 4.0. Isso simplificou a interface, mas a ausência da função ‘auto scaling’ que fazia um ajuste automático dos níveis de preto e branco na imagem dificulta a vida dos iniciantes. Mas a versão 3.0 continua disponível em: https://noirlab.edu/public/products/fitsliberator/download-past-versions/

Interface do FITS Liberator 4.0 (NOIRLab/IPAC/ESA/STScI/CfA).

SAO Image DS9

O SAO Image DS9 é uma ferramenta usadas por profissionais e por isso engloba funções avançadas de análise de imagens. É possível determinar coordenadas (astrometria) e medir magnitudes (fotometria) , traçar contornos, criar animações… mas tudo isso dentro de uma interface enxuta que não confunde os marinheiros (ou astrônomos) de primeira viagem. Profissionais e usuários experientes usam o DS9 principalmente através da linha de comando, integrado aos ambientes IRAF ou PyRAF.

Para iniciantes, a mais importante adição é a capacidade de combinar arquivos em camadas associadas às cores vermelha, verde e azul, criando assim imagens RGB coloridas. Recurso que pode ser muito útil para atividades educacionais com dados reais de telescópios.

SAO Image DS9 (Smithsonian Astrophysical Observatory, Center for Astrophysics, Harvard University)

O SAO Image DS9 é o nosso visualizador preferido e é o que utilizamos em nossas oficinas. Ele vem de uma longa linhagem que teve origem com o SAO Image em 1990. Uma segunda geração do software foi batizada de SAO TNG (numa referência ao seriado de ficção científica Star Trek – The Next Generation). A geração seguinte aproveitou o embalo e também pegou emprestado o nome de uma série derivada de Jornada nas Estrelas: Star Trek – Deep Space 9, chegando assim ao nome do nosso querido SAO Image DS9.

Apesar da capacidade de criação de imagens coloridas, tenha em mente que o DS9 não é um programa de edição avançada de imagens, ele é uma ferramenta de visualização e análise científica e se você deseja recursos estéticos mais avançados ou se quer combinar muitos frames para melhorar a relação sinal ruído de sua imagem deverá buscar outras alternativas.

A adição de novas funções sempre acrescenta uma maior complexidade de operação, por isso, no DS9 e em todas as ferramentas apresentadas a seguir acostume-se a ler a documentação e a aprender com usuários mais experientes em fóruns especializados.

O download do SAO Image DS9 pode ser feito no endereço: https://sites.google.com/cfa.harvard.edu/saoimageds9/download

Salsa J

O Salsa J é não é uma ferramenta profissional, mas incorpora funções de análise que podem ser utilizadas para tarefas mais avançadas em educação e em ciência cidadã.

Interface do Salsa J durante criação de imagem RGB a partir de arquivos FITS (EU-HOU).

É possível criar imagens RGB, medir magnitudes, tamanhos aparentes e analisar espectros. Sua interface é amigável e o programa roda bem mesmo em máquinas mais modestas.

Se você que um aplicativo leve, amigável e versátil e não faz questão de conhecer as ferramentas astronômicas utilizadas por profissionais, o Salsa J provavelmente vai fazer você muito feliz. Há muitos tutoriais e exemplos mostrando seu uso em sala de aula na educação básica.

O Salsa J e vários tutoriais estão disponíveis em: http://www.euhou.net/index.php/salsaj-software-mainmenu-9

Aladin

Aladin é um verdadeiro canivete suiço com mais funções do que o usuário médio jamais será capaz de sequer explorar. Ele é apresentado como um atlas celeste interativo que permite a visualização de imagens digitalizadas do céu de diversos levantamentos e sobrepor dados de catálogos e outros arquivos astronômicos, inclusive arquivos locais, além de acessas interativamente serviços de informações de objetos astronômicos como Simbad, VizieR e outras bases de dados para todos os objetos no campo.

Interface do Aladin 11 (Université de Strasbourg/CNRS)

O Aladin é o mais intimidador dos programas aqui apresentados e requer uma boa disposição para a consulta de sua documentação. Se seu objetivo é algo modesto como apenas criar uma imagem RGB a partir de arquivos FITS, optar pelo Aladin é algo como usar um canhão pra matar uma formiga. Ele certamente vai fazer o serviço, mas há opções mais econômicas para isso (e com curvas de aprendizado menos íngremes). Amamos o Aladin, mas achamos bem pouco adequado começar a usá-lo antes de dominar algumas conceitos que podem ser explorados em programas com interface mais limpa.

Mas se você realmente decidiu pela ousadia, pode baixá-lo em: https://aladin.u-strasbg.fr/

Um Recado Final

O fantástico mundo dos dados astronômicos reais está disponível para todos. Brincar, aprender e descobrir está ao alcance de qualquer pessoa com com um computador com acesso à internet e com conhecimento suficiente para operá-lo (você precisa ser capaz de instalar os programas e resolver pequenos problemas, comuns a esse tipo de tarefa, ou ter à disposição alguém que vá resolvê-los pra você) . Muitas vezes, as principais dúvidas apresentadas durante nossas oficinas se relacionam a tarefas do sistema operacional do usuário e uma vez sanadas, as tarefas de processamento dos dados segue sem tropeços.
A partir desse ponto o aprendizado vem com a experiência, mas a leitura de manuais é indispensável. A documentação destes softwares é bem completa e costuma cobrir a maior parte das dúvidas que você terá a começar a trabalhar com eles. Mergulhe sem medo nos manuais, eles serão seus companheiros se você pretender se tornar íntimo destes divertidos brinquedos que acabamos de apresentar!

Cometa Leonard já está visível em céus brasileiros: como localizá-lo no Stellarium Web

O Cometa C/2021 A1 (Leonard) já pode ser visto logo antes do nascer do Sol nos céus das regiões Norte e Nordeste do Brasil!

Nesse post, mostramos como utilizar o Stellarium Web (versão para navegador do simulador de céu Stellarium: https://stellarium-web.org/) para descobrir o melhor horário para observar o cometa da sua cidade.

Ao entrar no site, caso o Stellarium Web não encontre sua localização automaticamente, clique no botão inferior esquerdo para definir sua região no mapa. O botão da direita inferior abre os controles de data e horário.

Na madrugada de 06/12/2021, o cometa Leonard aparecerá no horizonte leste pouco antes do nascer do Sol, próximo à estrela Arcturus (é uma estrela bastante brilhante que você pode utilizar para se localizar no Stellarium e no céu).

Cometa Leonard no Stellarium Web: https://stellarium-web.org/skysource/Arcturus?fov=37.208&date=2021-12-06T07:10:07Z&lat=-10.18&lng=-48.33&elev=0

Assim que encontrá-lo, você pode selecionar o cometa com o mouse. O Stellarium Web abrirá uma janela à esquerda com as informações sobre visibilidade:

  • Magnitude: É o brilho aparente do cometa. Quanto menor o número, mais brilhante ele aparece no céu. Magnitude 6 é o limite de visão do olho humano em lugares livres de poluição luminosa.
  • Distance: Distância do cometa Leonard até a Terra em unidades astronômicas (1 AU é a distância média do Sol até a Terra).
  • Visibility: Período que o cometa permanece acima do horizonte da sua localização. Rise é a hora em que ele nasce no horizonte leste, e Set é a hora que ele se põe no horizonte oeste.

Quer saber mais sobre o Leonard e outros cometas? No dia 07/12/2021, terça-feira, às 20h estaremos ao vivo com o dr. Pedro Bernardinelli, descobridor do cometa gigante C/2014 UN271 (Bernardinelli-Bernstein) falando sobre esses objetos vindos dos confins do Sistema Solar! Ativa o lembrete: https://www.youtube.com/watch?v=UvXhNCFXw_c

Veja também:

Como Escolher um Telescópio

A aquisição mais procurada por entusiastas da observação do céu é definitivamente o primeiro telescópio. Instrumentos ópticos de qualidade infelizmente não são tão baratos, e não é raro que a frustração em mexer em um telescópio desnecessariamente complicado para um iniciante acabe o transformando num cabide de roupa no meio da sala. Por isso, escrevemos um guia para ajudar nos detalhes que precisam ser considerados ao se adquirir sem arrependimentos o primeiro telescópio, com dicas de fabricantes nacionais:

Primeira regra de ouro: aprenda o céu da sua região! Quanto mais você souber sobre os objetos que quer e pode ver, mais informação terá para auxiliar na escolha do modelo ideal. Aplicativos gratuitos de cartas celestes e simulação do céu: Stellarium, Carta Celeste, Sky Map. Para conferir a poluição luminosa da sua região: https://www.lightpollutionmap.info/. Além disso, observe se há muitas obstruções no horizonte como prédios e montanhas.

Captura de tela do aplicativo Stellarium.

Informe-se MUITO sobre os tipos de telescópios amadores e como funcionam. Você descobrirá que existem diversos modelos e a partir daí pode começar a refinar a sua procura de acordo com seu orçamento, necessidades e limitações. Já fizemos um post sobre os tipos de telescópios aqui: http://ceuprofundo.com/2020/12/31/conhecendo-os-tipos-de-telescopio/

Which Telescope Is Better: A Reflector Or Refractor?
Alguns tipos de telescópios. (Fonte: Astronomy Trek)

Há outras questões além do céu que devem ser consideradas, como se o telescópio precisa ser leve e prático para ser transportado (a casa tem escadas, por exemplo?) e quanto espaço há disponível para observação e para guardar o equipamento.

Binóculos são uma excelente opção para começar a prática da observação. Possuem preços mais acessíveis e são de fácil manuseio, permitindo que a observação e o estudo do céu sejam suas únicas preocupações no início.

“Até onde esse telescópio vê?”

O telescópio não trabalha com limites de distância, mas sim de brilho. Quanto mais brilhante o objeto aparece no céu, mais nítida será a imagem dele. Há objetos na nossa própria galáxia mais difíceis de observar do que outras galáxias.

Pense no telescópio como um balde de coletar luz para os nossos olhos. Quanto maior for o diâmetro do telescópio, mais luz ele captura e, consequentemente, mais definição e objetos menos brilhantes é possível ver com ele. O pessoal do DeepSkyWatch fez uma comparação muito boa entre os objetos vistos por diferentes telescópios e céus: http://www.deepskywatch.com/Articles/what-can-i-see-through-telescope.html.

Um dos recursos do Stellarium é a simulação de telescópios, no menu superior direito, com o qual é possível ter uma ideia de como um objeto aparece na imagem de acordo com as configurações do telescópio que você estiver considerando adquirir.

Captura do programa Stellarium. A opção de simulação de telescópios está circulada em vermelho.
Simulação do Aglomerado da Borboleta visto por um telescópio de 254mm de diâmetro e 1130mm de distância focal, com uma ocular de 25mm.

Além da imagem

O telescópio é composto por diversas partes. Uma delas é a montagem, a parte do telescópio que fica encaixada entre o tubo e o tripé – ela não é soldada, o que significa que você pode trocá-la por outra a qualquer momento.

No modelo azimutal, o telescópio fica livre para se movimentar para todos os lados, não tem segredo. O modelo equatorial tem vantagens, mas com um preço: é mais robusta de se manuear e tem movimentação mais trabalhosa.

Claro que todo mundo tem capacidade de aprender a usar a montagem equatorial! Mas se você for iniciante, talvez queira investir mais tempo explorando o céu do que se preocupando com montagens robustas e caras que talvez sejam desnecessárias para você no início. Recomenda-se começar com a mais simples (azimutal) e substitui-la no futuro caso seja uma necessidade do observador.

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Exemplos de montagens de telescópios.

Todo telescópio precisa de pelo menos uma ocular. Preste atenção se o telescópio já vem com uma ou se é vendida separadamente. São facilmente intercambiáveis e podem ser compradas em kit ou avulsas a qualquer momento. Não precisa comprar um lote inteiro de cara sem saber se são compatíveis com padrão do telescópio e se serão úteis para você.

Diferentes oculares. (Fonte: Wikipedia)

“Qual o aumento desse telescópio?”

A rigor, o telescópio aumenta o quanto você quiser. PORÉM, quanto maior o aumento, menor será a nitidez e qualidade da imagem. O termo utilizado é AUMENTO ÚTIL, que significa o quanto é possível aumentar a imagem sem que ela perca muita qualidade. Para calcular o aumento útil, multiplique o diâmetro do telescópio por 2.

O aumento depende também da ocular, e a conta é simples: distância focal do telescópio dividida pela distância focal da ocular. Sempre faça essa conta antes de comprar uma ocular. Se o resultado for maior que o aumento útil, há grande chance de se frustrar.

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Exemplo de diferentes aumentos e cálculo da magnificação. (Crédito: André Luiz da Silva)

No nosso exemplo do Aglomerado da Borboleta, temos um aumento de 1130mm/25mm = 45,2x.

CUIDADO com anúncios que prometem demais: “aumenta até 400x, 500x, 1000x!”. Se vir esse tipo de sensacionalismo, ligue o desconfiômetro na mesma hora. Anúncios ideais não prometem imagens perfeitas e mostram todas as especificações do telescópio sem rodeios.

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Marcas com boa qualidade e sem enganação com o consumidor: Celestron, Sky-Watcher, Orion, Meade, GSO.

Hoje, temos excelentes fabricantes brasileiros(!!!): Dario Pires, Sebastião Santiago Filho, Sandro Coletti, Rodolfo Langhi, Telescópios Matão. Os telescópios desses fabricantes são tão bons quanto os importados, e duram anos se você cuidar deles com carinho e do modo adequado.

Imagens Astronômicas: Os Pilares da Criação.

Os pilares da Criação. Uma região de formação estelar a cerca de 7000 anos luz, na Nebulosa da Águia (M16) em imagem composta a partir de dados de observações do telescópio Hubble.

Uma das imagens mais marcantes produzidas pelo telescópio espacial Hubble é o registro dos Pilares da Criação, uma vasta região de formação estelar na Nebulosa da Águia (M16).
Sua imagem mais famosa é composta por dados de observações realizadas pelo Hubble através de filtros que deixam passar apenas a luz nas frequências das emissões dos gases enxofre, hidrogênio e oxigênio ionizado.


Os detalhes visíveis nas colunas de hidrogênio molecular e o esplendor das cores na imagem processada são impressionantes e cativam a atenção de qualquer observador.
Mas hoje queremos mergulhar no interior dos Pilares e enxergar através do gás frio. Para isso, a solução é observar através de filtros que deixam passar apenas os comprimentos de onda mais longos da luz, na faixa dos raios infravermelhos, para os quais o telescópio Hubble também é sensível. O resultado é um belo complemento ao que temos na luz visível e revela o que se esconde sob o gás!

Mosaico dos Pilares da Criação, região de formação estelar na Nebulosa da Águia (M16) composto com dados de observações do telescópio Hubble na faixa infravermelha do espectro eletromagnético. [Dados: NASA/ESA/Hubble/STScI. Processamento: Wandeclayt M./Céu Profundo]
Gráficos de desempenho dos filtros opticos do telescópio Hubble no infravermelho. A observação da imagem anterior foi realizada pelo canal IR da câmera WFC3 (Wide Field Camera 3) do telescópio Hubble, utilizando o filtro F110W, um filtro optico que deixa passar apenas a radiação infravermelha na faixa entre 0.9 e 1.4 µm. [crédito: Space Telescope Science Institute (STScI)]

Para compor a imagem usamos o software gratuito SAO Image DS9. Disponível para os sistemas operacionais Linux, Mac OS X e Windows (download aqui).

Vamos agora ver como chegamos no resultado acima a partir das observações individuais.
O campo do sensor infravermelho na câmera WFC3 do Hubble registra uma área do céu de menos de 3 minutos de arco (isso é 10 vezes menor que o diâmetro aparente da Lua vista da Terra). Por isso, para enxergarmos toda a área dos pilares (que na verdade medem aproximadamente 5 anos-luz) precisamos reunir várias peças em um quebra cabeças.
A tarefa é razoavelmente simples, porque as imagens registram também as informações das coordenadas celestes da região observada e essa informação pode ser utilizada pelo DS9 para alinhar e unir corretamente as imagens em um mosaico.

Interface de busca da base de dados do Telescópio Hubble. Parâmetros: Target Name = M16, Radius (arcmin) = 10, Imagers = WFC3, Proposal ID = 13926, Filter/Gratings = F110W.

Buscaremos na interface de pesquisa (https://archive.stsci.edu/hst/search.php) arquivos de dados de imagem da nebulosa M16 (Target Name) num raio de 10 minutos de arco (Radius (arcmin)) , capturados com a câmera WFC3, através do filtro infravermelho de banda larga F110W (Filter/Gratings), dentro da proposta de observação 13926 (Proposal ID). Sugerimos a seleção, na janela seguinte, da extensão ‘drz‘, requisitando assim apenas arquivos calibrados e com geometria corrigida. Os arquivos serão disponibilizados em uma pasta num servidor ftp no link enviado para o email fornecido. O conjunto de imagens que requisitamos é composto pelas quatro imagens abaixo.


O sistema de coordenadas embutido nos dados é o que chamamos de WCS (World Coordinate System). É graças a ele que é possível identificar a posição de estrelas e outros objetos apenas movendo o cursor sobre a imagem no DS9.

Iniciaremos criando um frame em branco no DS9 (clique nos botões [frame] e [new] na barra de botões) e adicionaremos os arquivos FITS que formarão as peças de nosso quebra cabeças através do menu “File > Open as > WCS Mosaic Segment“.

Após selecionar cada arquivo a ser adicionado ao mosaico, selecione a opção WCS na nova janela de diálogo (figura abaixo) e clique em ok. Repita a operação para todas as imagens individuais.

Após carregar todas as imagens, clique no botão [scale] e na opção [log]. Em seguida, usando o menu superior, acesse “Scale > Scale Parameters…” e ajuste os parâmetros Low e High para os valores 10 e 3000, respectivamente. Você deverá chegar no resultado abaixo. É uma bela imagem, mas podemos melhorar a visualização mudando a escala de cores de ‘grey’ para ‘bb’, utilizando a barra de botões: [color] e [bb].

Por fim, chegamos em nossa versão da mais famosa nuvem molecular do universo! Os Pilares da Criação, agora em infravermelho! Você pode experimentar outras escalas e outros valores de parâmetros, comparando os resultados. Aqui não existem escolhas certas ou erradas, é apenas uma questão de evidenciar os aspectos que mais interessem na imagem. E por vezes o aspecto mais importante é a beleza do imagem final!

Visualização final no DS9, com opção de cor “bb”. A escala selecionada é “log”, com parâmetros Low = 10 e High = 3000. [Dados: Nasa/ESA/Hubble/STScI. Processamento: Wandeclayt M.]

Gaia – O mapeador dos céus.

Diagrama Hertzprung-Russel de 1 milhão de estrelas do catálogo Gaia EDR3 a menos de 200 parsecs.
Composição artística do satélite Gaia com a Via Láctea ao fundo. [créditos: ESA/ATG Medialab e ESO/S. Brunier]

O satélite Gaia não nos envia imagens exuberantes como o Telescópio Espacial Hubble, mas também se consagrou como um marco na história da astronomia, medindo com precisão sem precedentes o brilho, a posição, a distância e a velocidade de quase dois bilhões de estrelas.

Determinar a distância de objetos astronômicos é essencial para compreender as propriedades físicas desses objetos. Uma estrela que nos parece muito brilhante, pode na verdade ser um objeto modesto mas muito próximo de nós. Por outro lado, fontes que parecem apenas uma pequena estrela podem na verdade corresponder a uma galáxia inteira nos confins do universo observável. E o Gaia é o campeão na determinação destes dados que nos permitem calibrar nossas escalas astronômicas de distância, entender melhor a evolução estelar e estimar com mais precisão a própria idade do universo superando inclusive o já impressionante desempenho de seu antecessor, o satélite Hipparcos (1989-1993).

O catálogo final do Gaia estará disponível em 2022, mas três liberações públicas de dados parciais já foram realizadas – a última delas (Early Data Release 3 – EDR3) em dezembro de 2020. Os dados são públicos e os acessamos para criar o gráfico abaixo, conhecido como diagrama HR e fundamental para o entendimento da evolução das estrelas, utilizando dados de 1 milhão de estrelas do catálogo do Gaia, localizadas a menos de 200 parsecs.

O astrofísico Alexandre Oliveira, professor e pesquisador da Universidade do Vale do Paraíba, em São José dos Campos (SP), nos conta que “A excelente qualidade destes dados permite enxergar detalhes nunca antes percebidos, como a assinatura de tipos diferentes de Anãs Brancas, com núcleos ricos em Hidrogênio, Hélio ou Carbono, representados pelas três faixas estreitas no canto inferior esquerdo. Também é visível, na região das Gigantes Vermelhas, um adensamento de forma longa e diagonal conhecido como Red Clump, associado a estrelas de baixa massa que queimam Hélio em seus núcleos.

Diagrama HR de uma amostra de 1 milhão de estrelas localizadas a menos de 200 parsecs (652 anos luz) [créditos: Gaia/ESA/DPAC, Wandeclayt M./Céu Profundo]

Faça você mesmo: NGC 6302 – A Nebulosa da Borboleta.

NGC 6302 – A Nebulosa da Borboleta a partir de dados do Telescópio Espacial Hubble. [Dados de imagem: NASA/ESA/STScI, Processamento: Wandeclayt M./Ceu Profundo]

As imagens de objetos de céu profundo – galáxias, nebulosas e aglomerados estelares – produzidas com dados do telescópio espacial Hubble (HST) são tão fabulosas que acabam inspirando a pergunta: “Nossa, mas é uma foto mesmo? Dá pra observar ela assim?”

A dúvida é legítima e para ajudar a entender como nascem estas impressionantes visões astronômicas vamos compor juntos uma imagem da nebulosa planetária bipolar NGC 6302 – A Nebulosa da Borboleta – utilizando dados de arquivo do Hubble.

Primeiro ponto importante: as câmeras do Hubble não são coloridas. São sensores monocromáticos de alto desempenho, sensíveis a toda a faixa visível do espectro eletromagnético e a porções do infravermelho e do ultravioleta próximos.

Para compor imagens coloridas com os imageadores atualmente em operação no telescópio espacial – a WFC3 (Wide Field Camera 3) e a ACS (Advanced Camera for Surveys) – precisaremos combinar dados obtidos em observações separadas, cada uma delas utilizando um filtro diferente, que deixa passar apenas uma faixa (cor) da luz incidente.

Como o objeto a ser imageado é uma nebulosa, uma escolha comum de filtros é a que seleciona a luz emitida por alguns elementos abundantes em sua composição. Escolheremos filtros que deixam passar certos comprimentos de onda associados a átomos de hidrogênio, oxigênio e enxofre.

FiltroElemento
F502NO III (Oxigênio duplamente ionizado)
F658NH alfa
F673NS II (Enxofre ionizado)

Garimpando os dados

Temos então todas as informações que precisamos para fazer nossa busca por dados no arquivo do Hubble:

AlvoNGC 6302
CâmeraWFC3, ACS
FiltrosF502N, F658N, F673N
Dados para busca dos dados para composição da imagem da nebulosa NGC 6302.

Introduziremos esses dados na interface de pesquisa do arquivo do Hubble em https://archive.stsci.edu/hst/search.php

Interface de busca do arquivo do Telescópio Espacial Hubble.

O resultado dessa busca nos mostrará os dados arquivados de observações da NGC 6302 realizadas com as câmeras e filtros selecionados. Entre os resultados, encontramos um conjunto de exposições realizadas com a WFC3 em 13/03/2020, nos três filtros de interesse e com tempos longos de exposição (todos acima de 1000s). BINGO! São esses que vamos usar!

Resultados da busca. Os três arquivos selecionados são de uma mesma sequência de observação e utilizam os três filtros que nos interessam.

Requisitando os arquivos.

Antes de requisitar os dados, podemos visualizar uma prévia das imagens clicando sobre o nome dos arquivos. Este é um passo importante porque podem ocorrer falhas durante a observação, como problemas de guiagem do telescópio e estabilização da imagem, que resultem em dados inutilizáveis. Como cada arquivo individual pode ultrapassar os 200 MB, convém checar sua integridade antes do download.

Visualização prévia dos dados de imagem.

Após inspecionar cada um dos arquivos de interesse e de nos certificarmos que todos são aceitáveis, podemos requisitar os dados. Selecionamos os três arquivos e clicamos no botão [Submit marked data for retrieval from STDADS].

Requisição dos dados selecionados.

Na janela seguinte, configure o formato dos dados requisitados. Queremos apenas os dados já calibrados e com a extensão drc.

Você receberá uma confirmação de sucesso da requisição e um link de ftp para o download dos arquivos será enviado para o email indicado. Você pode acessar o servidor pelo navegador também, se não tiver um cliente de ftp em sua máquina. Salve os arquivos disponibilzados na pasta. Além dos arquivos de dados FITS, uma prévia em formato jpeg também estará disponível como referência.

E agora? O que faço com os arquivos?

Agora vamos criar a nossa composição RGB combinando os arquivos FITS que acabamos de baixar utilizando o software SAO Image DS9 (Disponível gratuitamente para Linux, Mac OS e Windows em https://sites.google.com/cfa.harvard.edu/saoimageds9/download).

  1. No DS9 crie um novo frame RGB ( utilize o menu Frame > New Frame RGB ou os botões [frame] e [rgb])
  2. Associaremos cada imagem a um dos canais RGB de acordo com o comprimento de onda do filtro utilizado, atribuindo ao canal vermelho (R) o filtro de maior comprimento de onda (F673N, SII), ao canal verde (G) o comprimento de onda intermediário (F658N, H alfa) e ao canal azul (B) o comprimento de onda mais curto (F502N, OIII).
  3. Selecione o canal ativo clicando na coluna Current na janela RGB. Em seguida abra o arquivo correspondente ao canal ativo utilizando o menu File > Open ou os botões [file] e [open] e repita a operação para os três canais.
  1. Ok, mas como saber que arquivo corresponde a cada canal? Você pode conferir na página com o resultado da busca, se ela ainda estiver aberta em seu navegador ou se quiser repetir a pesquisa, mas cada arquivo FITS carrega também um cabeçalho de metadados chamado Header que pode ser inspecionado dentro do DS9. Para inspecionar o header de um arquivo aberto clique nos botões [file] e [header] . Você verá um arquivo de texto como o da figura abaixo. Procure a informação “FILTER = “.
  1. Agora é só lembrar que R = F673N, G = F658N e B = F502N. Mas tem um detalhe aí… Estamos colocando o filtro F658N no canal G, mas na verdade a linha de emissão do hidrogênio alfa é também vermelha! Então é bom lembrar que o que aparece em verde na imagem é na realidade um outro tom de vermelho, mas com a nossa escolha de cores vai ficar bem mais fácil distinguir o que corresponde a cada filtro. Essa configuração é conhecida como “Hubble pallete” e se popularizou com a célebre imagem do Hubble: “Os Pilares da Criação”, que mostra detalhes da Nebulosa da Águia (M 16) com esse padrão de cores.
  2. Pronto! Agora que carregamos os três arquivos precisamos ajustar os histogramas. Comece com a imagem no canal R. Clique nos botões [scale] e [log] e em seguida acesse o menu Scale > Scale parameters…
  3. Você verá um histograma como o da imagem abaixo. Perceba que no gráfico, toda a informação está amontoada perto do zero, ou seja: está tudo muito escuro e vamos precisar “esticar” esse histograma. Introduza esses valores na janela: Low = 0.01 e High = 6.
  1. Repita esse procedimento com os canais G e B usando Low = 0.01 e High = 19. Você também pode experimentar outros valores e pode também tentar outras escalas além da [log]. É aqui que você pode dar seu toque pessoal na imagem. Como diz Rick Sanchez: “Às vezes a ciência é mais arte que ciência!“.
  2. O resultado pode ser algo como a imagem abaixo, mas não perca a chance de libertar o artista que existe em você! Brinque com parâmetros e escalas até encontrar uma combinação satisfatória.

E o nosso resultado final!

Depois de muitas experiências, ficamos felizes com o resultado da imagem abaixo. Mas para chegar nesse resultado a imagem passou por alguns passos adicionais em programas de edição de imagens. Você pode usar programas como o Photoshop ou o GIMP para fazer ajustes cosméticos na sua imagem, reduzindo ruídos, evidenciando detalhes, aplicando ajustes não lineares… E a verdade é que a gente nunca conclui a edição de uma imagem dessas. Sempre dá vontade de mexer um pouco mais, mas a gente acaba parando em algum ponto porque o arquivo do Hubble é enorme e o universo é ainda mais! E a gente já quer passar pro próximo objeto! Que tal uma galáxia na próxima tarefa?

NGC 6302 – A Nebulosa da Borboleta. Imagem RGB composta com dados do Telescópio Espacial Hubble (HST). [dados: NASA/ESA/STScI. processamento Wandeclayt M./Céu Profundo]